13 de fevereiro de 2011

Receita infantil para a construção do texto literário

humorTexto que é texto tem que ser humorístico. Não existe literatura que passe ao lado do humor. Literatura que dispensa o humor não é literatura, é chatice. É certo que o humor não se aprende na universidade (aliás, na universidade, hoje em dia, não se aprende grande coisa. Nem na universidade, nem em nenhum outro lugar, valha a verdade). Também não se nasce humorista. É por isso que é gema tão preciosa isto (perdão, isso) de fazer humor com as filhas da mãe das palavras.

Se quiseres ficar orgulhoso de um texto que consideraste bom (isto é, humorístico qb) deves publicá-lo de imediato. Escritores profissionais guardam-no em banho-maria para o relerem, reanalisarem, reconstruírem, revirgularem, reatapetarem, re-semiologiarem, repararem, reparirem no dia seguinte. Mas o que acabaste de escrever, e que te mereceu um íntimo sentimento de prazer, terá azedado no dia seguinte. Nada como o dia seguinte para estragar uma sobremesa deliciosa. Ou mesmo uma vida deliciosa. 

Vá. Se escreveste uma coisa com piada, mesmo que sejas só tu a ver-lha, ou que essa coisa já tenha sido escrita por alguém em 1458, publica sem delongas ou remorsos. Marimba-te no plágio não doloso. Escreve. Não estás farto de ver textos massivamente aclamados que não passam de borrões de escrita analfabética? Se amanhã não achares piada nenhuma, ou se mesmo hoje ninguém te leu, ou compreendeu, ou sentiu, ou sorriu, não importa. Tu sorriste, gostaste, sentiste, compreendeste, admiraste, e é tudo. É teu. Só pode ser teu. E o texto passa a existir. E tu também, que diabo.

Mas olha, nunca escrevas nada que tenha absoluto bom senso. Livra-te dos lugares comuns. Nunca caias na esparrela de ser consensual, não passes a tua curta vida literária a concordar com todos. Não te esforces por parecer sóbrio, sobretudo se o não estiveres. Muito melhor é estar sóbrio fingindo de bêbado do que estar bêbado fingindo de sóbrio. Nunca percas grande tempo a ler quem escreve com demasiado juízo. Evita, despreza mesmo, os textos politicamente correctos. Os textos e as atitudes. E, já agora, as pessoas. Sê toleirão, obtuso, descarado, estranho, oblíquo, marginal, puto, quanto puderes. Pronto, produziste um texto belíssimo. (Ainda que só tu e eu o saibamos…)

Post 702      (Imagem daqui)

2 comentários:

Anónimo disse...

Ah como gostei!!!! Como desconcertas e baralhas tudo, fantástico. E de rir, claro, e chorar por mais!
Bj Faty

Anónimo disse...

Grande teórico da literatura!
Estás certíssimo.
Amirgã