Por vezes acontece-me vestir o capote da razoabilidade.
É fantástico. A gente enfia aquela indumentária ridícula e perece outra. Dizemos trivialidades iguais às de toda a gente, somos previsíveis como calhaus, rimos de imbecilidades, aceitamos as nossas lorpices e compreendemos as de toda a gente.
Apertamos as mãos e falamos do tempo, esperançados na chuva, no sol e no vento e parecemos estar de bem com a natureza e com as nossas vidinhas medíocres e desprezíveis.
Saudamos cordialmente cada novo dia, ouvimos as notícias com recato, rimos alarvemente das piadas do Markl e do Malato. Enfim, integramo-nos no bando imbecil dos acomodados.
É fantástico como este capote da razoabilidade, assente sobre o colete da moderação, nos simplifica a vida e o relacionamento com os outros! Tornamo-nos, de repente, cidadãos respeitáveis. Depois, é só apagar do domínio público o tipo pestilento que éramos antes de o vestir.
Tudo está agora em paz e a vida pode voltar a sorrir…
Assim vestidos, até conseguimos aplaudir a minúscula remodelação ministerial.
E acreditamos, devotamente, que o facto de o governo não se ter remodelado em bloco se deveu apenas à incúria do porteiro que o deixou trancado lá dentro e perdeu a chave…
(Juro que não era minha intenção dirigir o post para este lado. Mas, abafando de torpor e lassidão dentro do capote, despi-o compulsivamente.)
Razoabilidade? Delicadeza? Mediocridade? Sujeição? NÃO. Antes pão seco que tal conduto...
Remodelei-me, pois então.
(Imagem tirada daqui)