Seja quem for que nos venha a governar, estará rouco. Nosso próximo primeiro-ministro será sem dúvida um indivíduo afónico e, simultaneamente, (o que talvez seja pior) impotente. Nosso futuro primeiro ficou rouco por berrar alarvidades e impotente por as sufocar. Jamais se vira enrouquecer tanto por tão exígua qualidade discursiva, tonitruante potência pulmonar na razão directa da vulgaridade das ideias.
Não nos iludamos. No momento em que decidimos partir para estas eleições, momento esse que coincidiu com um pedido de empréstimo ao banco maior, já sabíamos que só havia dois caminhos no horizonte: optar por saldar a dívida e continuarmos de cabeça medianamente erguida; ferrar o calote e hipotecar o país com ministros e monumentos e campos de golfe e fábricas e misérias e a História e os Lusíadas e hotéis e spás e três dinastias de reis e outras tantas de burrice crónica e de chicoespertismo primário. Obviamente, havia uma outra hipótese: não pedir o empréstimo e pagar os salários com tomates, abóboras e pepinos (antes da sua desvalorização pela escherichia coli).
Mas é na decisão pelo comportamento digno e honesto, isto é, o pagamento do que devemos, que reside o mais radical impasse, o mais intransponível obstáculo à salvação deste improvável país. Optar por cumprir os nossos deveres (armados em país de boas contas que aceita orgulhosamente encostar a barriga ao balcão depois da rodada geral) arrasta consigo o seu contrário, ou seja, a impossibilidade técnica de os cumprir algum dia. Não passa de tomar os desejos por realidade. Mesmo nos nossos sonhos mais aventureiros, não ousaríamos acreditar que seremos capazes de pagar 78 mil milhões, a juros de 5 por cento, em menos de dois ou três séculos, isto se estivermos a ser imprudentemente optimistas.
Mas os nossos candidatos acreditaram nisso e enrouqueceram por isso. Não valeu a pena terem maltratado tanto as suas desgastadas cordas vocais. Tanto mais que precisarão delas para mandar calar os alaridos da populaça…
Post 745 (Imagem daqui)
3 comentários:
Com estas eleições inesperadas, surgiram de novo as ridículas campanhas,regadas de beijinhos e pézinhos de dança e abundantes em "papo furado" de políticos regidos por interesses próprios e alienados dos verdadeiros problemas do país.Políticos e governantes que hipotecaram o nosso futuro e o das gerações futuras com a sua incompetência e, como dizes e muito bem, com a sua total inconsciência face à um empréstimo que dificilmente conseguiremos pagar. Marla
Muito em dito.
bem dito... :)
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