| Esse trabalho, desenvolvido numa comunidade escolar embrutecida, burocratizada, grosseira, medíocre e abusivamente lerda, arrisca-se a produzir mais um problema, em vez de criar as tão desejadas soluções. |
Defendi aqui sempre as posições de Nuno Crato no que se refere às questões da Educação. Ele e Santana Castilho tomaram posições de relevo contra o bando dos psicólogos da educação, principais responsáveis pela estupidificação dos processos de aprendizagem e o descalabro de todo o sistema educativo. Ambos aqui desancaram nos modelos “socialistas” da avaliação docente, propondo modelos mais sérios e eficazes com vista às aprendizagens. Ambos defenderam um processo de ensino mais voltado para a aquisição de saberes científicos e competências técnicas do que para as componentes psicossociológicas. Dir-se-ia que se reinventaria o discurso do ensino/aprendizagem, preferencialmente centrado nos saberes científicos e relativizando a omnipotente e ubíqua componente psico-pedagógica. Nesta conjuntura, não posso deixar de saudar a escolha de Nuno Crato para presidir aos destinos da Educação em Portugal. Porém, também aqui defendi muitas vezes, e com igual veemência, que o projecto Crato para a educação não seria destituído de dores relativamente desconfortáveis. Asseverei muitas vezes que o seu desígnio não seria pêra doce e que o que ele pediria aos professores teria forçosamente de ser coisa séria. Ele certamente depuraria o sistema de todas as frivolidades e maneirismos que o empecilham e o remeteria à sua essencialidade. Mas também afirmei sempre que o grau de exigência que ele imporia aos professores, sobretudo na componente científica e na qualidade do desenvolvimento curricular, seria | extraordinariamente maior. Também disse que, com qualquer um deles, Castilho ou Crato, tudo se focalizaria em absoluto na competência didáctica e no esforço a desenvolver na construção de uma relação pedagógica correcta, disciplinada, substantiva e eficaz. Eis agora o Crato na pasta da Educação. Acredito que o que vem por aí seja muito bom, mas também será muito pesado. E sei que não faltará contestação se a filosofia que ele sempre apregoou for, de facto, implementada amanhã. Um trabalho de rigor e qualidade levado a efeito por professores que tenham compreendido as verdadeiras opções e fins últimos da educação não será pêra doce e não deixará incólume nenhum dos actores no terreno lodoso em que operam. Esse trabalho, desenvolvido numa comunidade escolar embrutecida, burocratizada, grosseira, medíocre e abusivamente lerda, arrisca-se a produzir mais um problema, em vez de criar as tão desejadas soluções. Resta mais uma hipótese, que resulta do estado de calamidade económica em que temos que nos mover: correr tudo a cortes de toda a ordem, dispensar grande parte dos professores, aumentar desmesuradamente a carga horária dos docentes que restarem, sobrecarregando-os com mais e mais medidas de acompanhamento a alunos que não desejam ser acompanhados, baixar os salários até ao nível do irracional, introduzir cláusulas de rescisão com base em originalidades criativas e avaliar os professores por meio de duas ou três aulas assistidas. Esta hipótese poderá muito bem ser a que nos espera a todos. E, se assim for, não nos servirá de nada ter Nuno Crato na Educação. |
4 comentários:
Como gosto de te "ler" sobre educação. Muito bom. Vamos ver, pois. Era tão bom a escola voltar a centrar-se nos saberes, no conhecimento científico.Como eu defendo isso, desde sempre.Urge.
Excelente visão sobre a educação em Portugal!Certamente, o que se avizinha não será "pêra doce", mas se este senhor souber auscultar os verdadeiros problemas na educação e tentar implementar estratégias sérias, mesmo implicando alguns sacrifícios para os professores / alunos, talvez tenham valido a pena as mudanças na pasta da educação. Veremos o que nos aguarda... Marla
Muito bem. Regressando à tua escola, há 36 anos, sabias (ou disseram-te) que um dia apenas chegava para realizar todos os conselhos de turma e havia ainda tempo para umas confraternizações?
Marla e Faty, obrigado. Concordo plenamente com ambas. Pode ser que haja alguma mudança, quem sabe... Grande abraço.
OLima, não, não sabia. Só lá estou há 22 anos. Nesse tempo não era preciso mudar notas. Agora começamos com um 1 e acabamos com um 3. E isso, obviamente, leva algum tempo...:)
Outro abraço.
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