30 de dezembro de 2010

Nada de novo…

ricos pobresEm 2011, os directores, coordenadores de serviços e chefes de sector da Segurança Social serão promovidos e verão os auferimentos das suas despesas de representação aumentadas em 30 por cento, tudo rigorosamente legal, como sempre. Saiu hoje mesmo, no Diário da República. Boa e santa medida! Que, no meio da penúria geral, haja alguém, isto é, uma pobre  classe dirigente, que passe a ganhar mais. Eis, pois, uma medida tão propícia quanto o momento em que se publica, com o povo já embotado de bêbado, sem perceber nada do que se passa, sem conseguir já focar a letra miúda do Diário, entretido que está a festejar 2011, o ano da sua ruína completa. A medida governamental que ora vê a luz do dia, se aplicada num momento de sobriedade nacional, com o povo atento e lúcido, seria, no mínimo, desaconselhável. Porém, em plena passagem de ano, já no meio dos vapores da alegria lorpa, das passas rançosas, da tosca bovinidade e do espumoso gaseificado, tudo passa na santa secretude da minúscula letrinha dos despachos da lusa governança…

(Imagem daqui)

A seguir: “José Duarte - uma singelíssima homenagem” em obsessões…

29 de dezembro de 2010

repescando tralices

FotoSketcher - relogio 2A 18 de Dezembro de 2007 (um pouco antes da primeira fase do descalabro educacional, provocado por Maria de Lurdes Rodrigues, que acabou por destruir a escola pública a ponto de esta nunca mais se levantar), escrevia-se aqui o gafanhoto, uma primeira abordagem à questão educativa, que transcrevo a seguir, para vos evitar o trabalho de ir lá ver.

O Gafanhoto

Há um enorme gafanhoto âmbar empoleirado num dos armários da SP. Mesmo por cima dos livros de ponto. Entra gente e sai gente mas ninguém parece vê-lo. Enorme e translúcido, paira embaraçado entre o medonho e o ridículo. Remete-me, facilmente, para Abraão ou Noé, ou outro qualquer bíblico patriarcudo, comendo gafanhotos meia dose, assim a cru, nos tórridos desertos do Velho Testamento. Esta á a pose grotesca do gafanhoto da SP, alcandorado no topo do armário, equilíbrio instável, ameaçando estatelar-se. Mas quando o observo com o meu olho mais negro, vejo-o mostrengo, ferino e horrendo, despedindo lasers de âmbar e brandindo gigantescas pinças e armaduras bucais extensíveis, numa febre milenar feita de vingança e ódio.

E eu, sem despregar nenhum olho da besta ambarina, fico a delinear duas opções nesta encruzilhada: 1. Sou um professorzinho insignificante e acabrunhado e deixo que o gafanhoto me engula; 2. Sou um profeta alucinado, vagueando sequioso no deserto, e papo, de uma assentada, o gafanhoto tamanho família, para evitar baixar-me tantas vezes…
Claro que foi uma visão.
(Mas este gafanhoto sanguinolento chega em Janeiro. Asseguraram-mo hoje.)

(Imagem daqui)

27 de dezembro de 2010

minudências minhas

  A colher antiga cozinha  imagem Subjects RetroA colher velha

Encontrei ontem uma colher de sopa. No fundo de uma gaveta inexpugnável, de alquebrado armário no sótão soturno do esquecimento. Foco, João, foco. É um sótão mesmo, real, soalho rangente, clarabóia, telhas. Mas soturno, sim, convenhamos, e esquecido, time-capsule de um tempo que passou. Uma colher de sopa, de alumínio, ou de prata, ou de estanho. Qualquer coisa menos aço inox. Escurecida e perdida em pensamentos, lágrimas de saudade pendiam-lhe do cabo… Foco, João, foco. Uma colher velha, sem valor. Assim é que é. Uma mão de mulher, mão de trabalho, mão de jeira, mão de carinho, pegava nela nos dias de domingo. Depois da missa. Mexia o oloroso café de uma cafeteira mítica que procurei depois como um louco, mas não encontrei. “Está feito, para a mesa!”. “Vamos ,João?” “Vamo pai, vamo depersa”. Foco, João, foco. O cheiro do café e da segurança, do calor, do aconchego, do tudo que era então. A colher de alumínio, de prata, estanho, a mão de minha mãe, os meus 5 anos, a voz cava e meiga do meu pai, a esperança, o sonho, o futuro. Foco, João, foco.

(A colher velha – time-capsule da alma)

(Imagem daqui)

26 de dezembro de 2010

A blogosfera, outra vez

blogosferaA blogosfera adora os comentários. Acredito que ela surgiu para provocar. Ela nasceu simultaneamente cordata e impulsiva, jovial e telúrica, pacata e inquieta. E a sua ambição mais consuetudinária terá sido sempre suscitar desassossegos, risos, afeições, desconfortos, fúrias. O blogger aprecia que o invectivem, o critiquem, o aplaudam, o censurem, o odeiem, o venerem, mas detesta que o ignorem. Ele é um tímido que quer conquistar o mundo, um ousado que morre de medo, um racional que demanda corações. Arrogante na autoavaliação, desmorona na dúvida, submerge na incerteza. Sabe-se bom, e útil, e enorme. Desconfia-se medíocre. Receia-se inútil. E precisa que o comentem, mal ou bem, mas fundo, fundo.

(Imagem daqui)

Próximo post: A colher velha na rubrica Minudências minhas

O Tralapraki fez capicua hoje: 666 posts nos seus quatro anos de vida

25 de dezembro de 2010

My very particular Standard and Poor’s

standard and 2Mandei-os vir. Os do FMI. Ontem. Para resolverem o meu problema de cash-flow. Quer dizer, de pelintrice. O seguro do bolinhas vence agora em Dezembro e reclama o pagamento da anuidade. Na verdade, tudo reclama dinheiro em Dezembro, e também nos restantes meses, todos os anos, várias vezes ao dia. Dantes tinha a certeza de que, se não saísse de casa, ninguém me extorquiria um centavo. Agora vêm a casa. Instalam-se. Levam-me tudo. Depenam-me. Espreitei para o número de três algarismos da factura do seguro. Fora de cogitação. Em Janeiro vendo o bolinhas, se alguém existir ainda com um trocado para mo comprar. E talvez aproveite para vender o T1, que nunca me serviu de nada, pois nem uma única garota consegui lá levar. E agora, nesta idade, o que para lá levo são colites espásticas e a minha mais recente companheira, a artrite reumatóide. Só consigo capital a juros de 100 por cento. De modo que a minha very peculiar Standard and Poor’s aconselhou-me a demitir (ou será só exonerar) o meu estômago das suas funções. “Ah, porque esse bicho é um sorvedouro de orçamentos, e mais isto e mais aquilo, que come como frieira atrevida, que bebe mais que o Madail e o Alberto João juntos”. Pensarei nisso depois do Natal. Para já, resolvi fazer com ele assédio moral: arranjei-lhe uma desmotivante gastrite. À noite já não come nem bebe, nem sequer deseja isto nem aquilo. Só arde. E refluxa. Mas é um corte importante do lado da despesa que pode aquietar os mercados financeiros e restituir-me o bife grelhado semanal. Sem constrangimentos nem mostarda.

(Imagem daqui - A Tragédia Grega. A nossa não é sem braços. Temo-los, de facto, mas estão de tal modo agrilhoados que é como se os não tivéssemos. Do mesmo modo, nunca pegaremos a providencial escada que eventualmente nos lancem)

Amanhã: “A Blogosfera outra vez”

24 de dezembro de 2010

minudências minhas

desistirO autocarro

Afinal há uma carreira docente. Vi uma série de professores apanharem o autocarro dessa carreira, ontem mesmo, antes que fechasse o sinal, o curro, o ano civil. Guedelhas ao vento, pensamentos frívolos, um olho no burro e outro no cigano, como se só houvesse uma vida e essa fosse uma carteira depauperada, venceram lestos os degraus do novíssimo escalão.  Eu é que, embevecido com James Joyce, o decorador de interiores (eu próprio irresoluto e confinado no âmago introspectivo dos meus fossos, silente no desalentado ultraje de quem chega ao fim), não o ouvi chegar…

(Imagem daqui)

Amanhã: “My very particular Standard and Poor’s”

23 de dezembro de 2010

obsessões do meu ipod (24)

George_Gershwin_1937

Billie Holiday, Dinah Washington, Ella Fitzgerald, Caetano Veloso, Kate Bush, Peggy Lee e, agora, Diana Krall, todos interpretaram “The Man I Love”, uma pimbalhada da pior espécie escrita por George Gershwin (1898/1937) que é,apenas, o melhor compositor americano do século XX. De facto, da clássica ao jazz, passando pelo music-hall e pela música popular americana, todos os géneros o talento de Gershwin visitou com inelutável mestria. E, no entanto, The Man I Love podia ter sido composta pelo mais encaracolado dos pimbalheiros portugueses e, evidentemente, seria uma chachada medonha. Mas em americano resulta obra-prima, sem ironia e sem favor.  Apenas sabor e deleite…


(Imagem daqui)

Someday he'll come along, The man I love
And he'll be big and strong, The man I love
And when he comes my way
I'll do my best to make him stay

He'll look at me and smile, I'll understand
Then in a little while, He'll take my hand
And though it seems absurd
I know we both won't say a word

Maybe I shall meet him Sunday,
Maybe Monday, maybe not
Still I'm sure to meet him one day
Maybe Tuesday will be my good news day

He'll build a little home, That's meant for two
From which I'll never roam, Who would, would you
And so all else above
I'm dreaming of the man I love

George Gershwin (Talvez Ira gershwin)

Algum dia ele virá  O homem que eu amo  E ele será grande e forte O homem que eu amo  E quando chegar  Eu farei de tudo para ele ficar aqui

Ele vai me olhar e sorrir Eu vou entender tudo E um tempinho depois... Ele vai pegar a minha mão E mesmo que isso pareça um absurdo  Nós não vamos dizer nenhuma palavra

Talvez eu o encontre no domingo Talvez na segunda-feira, Talvez não Mesmo assim Eu tenhoc erteza que vou encontrá-lo um dia Talvez na terça-feira Isso vai ser a minha boa notícia do dia

Ele construirá uma casinha bem pequena só para nós dois Eu nunca vou sair dali Quem sairia, você sairia? O futuro a Deus pertence Eu estou esperando pelo homem que eu amo

Caetano Veloso

19 de dezembro de 2010

Não se sabe bem que coisa poderá aquela ser…


atenas

Hoje não me apetece fazer a revolução. Estou reaça, pronto. É certo que na Grécia há um foco de revolta, uma hipótese de proletarização, ou será só um miasma infecto sem proveniência conhecida, uma lumparia assanhada que não tem ideia do que faz, nem do que lhe está a acontecer...

Se eu estivesse no início da década de 70, com 20 anitos incompletos, estaria a pedir à célula de Coimbra do meu socialístico e esquerdoso partideco de então que me pagasse uma passagem no Sud Express até à capital das luzes e depois pelo Expresso do Oriente até Atenas, só para ir ver aquilo de perto. Mas agora não. Agora fico aqui, quieto e calado, desejando ou temendo (muito mais este gerúndio que aquele, 

meu Deus, como estou reaça… e velho) que algo aconteça, ou mesmo que não aconteça nada porque no news, good news, e depois de mim virá quem de mim bom fará e quem vier atrás que apague as luzes, ou feche a porta, ou ambas as coisas.

 

Sabe-se porque começa uma revolução, sabe-se que a situação na Grécia é uma semente proletária. Mas não se sabe como e quando uma revolução termina, nem que semente é essa que se deita à terra, nem que árvore ou escalracho brotaria dela… Sabíamo-lo todos antes. Agora não.

(Imagem daqui)

11 de dezembro de 2010

É só uma linda fotografia…

escola de todos Os professores trabalham, de facto, mais. Em contrapartida, passaram a ganhar menos, estagiando perpetuamente no mesmo escalão, devido à crise e ao azar de terem nascido aqui. Até nisto a educação melhorou, ao se obterem melhores resultados com menos esforço orçamental.

(Imagem daqui)

Não, não há facilitismo. O que há é uma simples mudança de paradigmas. Dantes também havia alunos que se entretinham a odiar os professores ou a troçar deles, a arreliar os mais velhos com as suas arrogantes mesuras e a sua já deficiente educação cívica e valorativa. Já desde Horácio que os há, e os houve no salazarismo, e nos anos 80 e 90. Desde sempre houve estudantes que detestaram a escola, o estudo, o trabalho, a ordem, a disciplina, o saber. Desde sempre houve estudantes que faltavam às aulas para se drogarem, que estragaram o material escolar por mero prazer, que atentaram contra a pequena propriedade privada dos pobres professores, roubando-lhes as ameixas, quebrando-lhes as janelas, açulando-lhes os cães, espavorindo-lhes o cavalo ou riscando-lhes o automóvel. Desde sempre. Mas nesses escandalosos tempos também havia chumbos, os vergonhosos chumbos que tanto comprometem os governantes de um país e tanto perturbam a sua imagem no exterior.

Mas, segundo a OCDE (que coisa será isto?), melhorou-se muito! A educação finalmente arrancou e Portugal, tal como fez com o deficit externo, está no bom caminho também em matéria de educação. Os nossos alunos recrudesceram na selvajaria, mas as notas subiram substancialmente. Os professores passaram a trabalhar mais, desperdiçando grande parte do seu tempo em substituições inconcebíveis, apoios a alunos que só aparecem nas vésperas dos testes e num horário acrescido de aulas suplementares (não remuneradas, é claro, para não

destoar) destinadas a alunos com muitas dificuldades porque, em vez de estarem atentos, estiveram a arreliar o professor nas aulas curriculares. Os professores trabalham, de facto, mais. Em contrapartida, passaram a ganhar menos, estagiando perpetuamente no mesmo escalão, devido à crise e ao azar de terem nascido aqui. Até nisto a educação melhorou, ao se obterem melhores resultados com menos esforço orçamental. Os professores estão, de facto, a trabalhar mais, mas a ensinar menos, porém o suficiente para fazer a OCDE (mas que porra será isto?) abrir a boca de espanto, os olhos de respeito e os cordões à bolsa de júbilo, tal como o papá descola um ipod novo quando vê um bom.

Os professores continuam a apanhar dos alunos, a serem gozados por eles, a rebaixarem-se timidamente perante pais cada vez mais agrestes, a verem os seus carros maltratados, só que a mudança de paradigma de que falei antes dita-nos agora que a culpa de tudo é exclusivamente dos professores (mesmo a culpa do artificiosamente colorido retrato publicitário para Europeu ver).

Só não sei o que se dirá quando se descobrir que os cabos-rasos dos professores também sabem iludir (-se), aceitando ficar na linda fotografia do sucesso educativo…

Um a um, vão-se aproximando do fotógrafo borboleta, tomando lugar nas bordas da foto, de onde facilmente poderão ser um dia recortados…

9 de dezembro de 2010

mais uma incursão pela (ir)realidade da escola pública

esquizofrenia É certo que a escola não inventou a esquizofrenia em que se move, visto que a escola não tem capacidade para inventar nada. Ela deixa-se simplesmente penetrar por ela (a esquizofrenia), com a promessa de se sentir depois mais feliz e realizada.


(Imagem daqui)

A escola pública está esquizofrénica. O que se passa dentro dela, e a montante e a jusante dela, é uma complexa teia de irracionalidades, todas convergentes numa mesma disfunção social, como se ela contaminasse mesmo os clientes que ainda não a frequentam. Evidentemente, a jusante, isto é, os que de lá saíram, esses estão sem remédio, metidos na camisa-de-forças que é a incompetência situacional. Ao saírem da escola secundária (e porque não da superior?), as gentes que nela sofreram durante 17 mais ou menos risonhos anos adquirem um estado de demência sem retorno, que os levará até o limiar do seu nível de incompetência que, no dizer de Peter, é um plano social e profissional indisponível para promoção.

Já ouço os meus leitores perguntar a razão porque estou a dizer isto. Essa é uma questão a que não posso responder. O objectivo de eu falar disto é tão obscuro como a intenção da própria escola pública. Não posso, pois, responder com clareza, a menos que se satisfaçam com a resposta

esquizofrénica de que estou a falar disto simplesmente porque sei que é assim. Reconheço que, para uma pessoa normal, o facto de se saber uma coisa não é razão para se falar dela. Mas não para um esquizofrénico. Já viram? Eu sou professor e garanto que aquele meu colega que toma bicas de empreitada está com problemas em entender o que eu digo, não porque eu sou esquizofrénico e ele não, mas antes porque ambos o somos, porém de maneiras esquizofrenicamente diversas.

É certo que a escola não inventou a esquizofrenia em que se move, visto que a escola não tem capacidade para inventar nada. Ela deixa-se simplesmente penetrar por ela (a esquizofrenia), com a promessa de se sentir depois mais feliz e realizada. Qualquer namorado faz o mesmo. E ela, claro, colabora. Qualquer rapariga apaixonada faz o mesmo, desde que não doa.

É isso, amigos. A escola só parece desejar que nada doa. E os partos, depois, serão também com epidural. É a felicidade indolor para todos, a esquizofrenia universal da suprema e resplandecente bem-aventurança…

(Ah, tem outros ainda piores que eu, sabiam?)

PS: Corrijam-me lá isto, vá lá. É Natal…

8 de dezembro de 2010

Festas Felizes

Baixa - Lisboa

O Tralapraki deseja a todos os seus leitores um Natal feliz e um Ano Novo próspero. Não, não estou a ser irónico. É exactamente isso que lhes desejo. O facto de não acreditar muito nisso é assunto de outro departamento…

(Imagem daqui)

obsessões do meu ipod (23)

tony benett

Tony Benett (1926) e Stella by Starlight (1946 – o poema, escrito sobre música de filme)

The song a robin sings,
Through years of endless springs,
The murmur of a brook at evening tides.
That ripples through a nook where two lovers hide.


That great symphonic theme,
That's Stella by starlight,
And not a dream,
My heart and I agree,
She's everything on this earth to me.
That great symphonic theme,
That's Stella by starlight,
And not a dream,
My heart and i agree,
She's everything on this earth to me.

(Imagem daqui)

5 de dezembro de 2010

Papa Bento e o Complexo do Alemão

complexo alemao

Também temos cá cancros como as favelas do Rio. Mas mandamos para lá a GNR, com um Jipe, carpélio e autocolantes, com cachorro na chapeleira acenando a cabeça ameaçadora, anda lá anda!

 

(Imagem daqui)

Do Brasil vem, mais uma vez, uma lição de como se resolvem os problemas. É caso para chamar a atenção da Desintelligentzia portuguesa e dizer-lhes: Viram? É assim! Os estados marginais dentro de estados visíveis combatem-se assim: pela ostentação da força. E que ninguém tenha ilusões de construir a paz com santidades, direitinhos humaninhos, democracitezinhas e rodos de compreensão. O papa ficou muito consternado com a violência e pediu não sei a quem para que acabe a violência no Complexo do Alemão e na Vila Cruzeiro. Ora, seu Bento Pio Não Sei das Quantas, tenha maneiras, homem! Vá, reze, que rezar é o que melhor sabe fazer. Alguém que saiba Latim explique a esse Santo que esta violência é o começo de uma vida nova para milhares de pessoas, uma vida digna, liberta e próspera. Reze, homem, para que não caiam inocentes, que os há certamente no meio disso tudo. Mas não se oponha a esta violência, que por vezes só ela pode gerar a paz e a concórdia no futuro. No Brasil sabem disso, à custa de simplesmente não serem burros

para sempre. No Brasil estão apostados em fazer bem o que tem de ser feito.

(A comparação com Portugal é inapelável. Juro que preferia ficar por aqui, mas não posso. O exército português, se continuar como era quando eu lá estive faz 37 anos, prefere esperar para ver, olhar para as possíveis invasões territoriais, responder aos apelos da Nato e tomar o seu whisky ao fim das tardes calmas recostado nos estrelados sofás da messe de oficiais. Também temos cá cancros como as favelas do Rio. Mas mandamos para lá a GNR, com um Jipe, carpélio e autocolantes, com cachorro na chapeleira acenando a cabeça ameaçadora, anda lá anda! E é por isso que este pobre país continua a ser pasto tenro para toda a casta de parasitas, de gatunos, de mafiosos, de corruptos e de celerados.)

Reze, Bento Qualquer Coisa, reze. Mas olhe, é fundamental mudar radicalmente muita coisa, leia-se, quase tudo.

Será que só rezar adianta, homem de Deus?