Era escurão. Não me pareceu tipicamente afro, mas era escurão. Pequenas várias cicatrizes percorriam-lhe testa e faces. Blusão sujo, cabelo rapado, beiçola superior proeminente. 16 anos. Entrou, olhar distante, no Gabinete do Aluno, espécie de prisão para os facínoras, instaurada pelas novas escolas, a fim de combater a indisciplina generalizada que as transformou em atafulhados manicómios, onde não se sabe quem leva a palma em matéria de sandice e desvario, se os alunos, se os professores, se os outros… Entrou assim, de esguelha, pisando ovos, com seus ténis descomunais. Veio enviado por um professor que não o consentiu na aula. Vinha revoltado pela injustiça de que tinha sido vítima (outros alunos também mascavam pastilhas e, contudo, ficaram na aula), mas com palavras sussurrantes, melífluas, que mais pareciam de afecto. (A revolta assim expressa costuma ser mais preocupante do que quando existe natural e espontânea | correlação entre ela e as palavras usadas para a exprimir). Vinha por ter cometido o crime de mascar chicletes na aula. Regulamento Interno, artigo 116, parágrafo único, é o que é. E era escurão, embora não me parecesse tipicamente afro. Não sabia o nome do professor mas era Matemática a aula. A falta do nome do professor contrariou a responsável pelo gabinete, já ia ficar um campo por preencher. (E dá trabalho ter que bisbilhotar depois quem foi o professor, normalmente dá para perder o intervalo, quiçá o apetite…) (Imagem daqui) |
1 de novembro de 2010
grades
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2 comentários:
Retrato, a merecer um excelente, de um alegado suspeito supostamente afro ou(?) cigano, pezudo e de andar de lã, sussurrante e melífluo, da justiça atafulhada de burocracia, da prisão preventiva em sítio de mordomias, da docência desmotivada.
OF
Sim, é exactamente tudo isso, mas aqui, neste curto comentário, ficou mais perfeito.
Abraço.
joao de miranda m.
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