Voltei à missa!
Bem, a expressão não é rigorosa. O que aconteceu é que consegui assistir à missa de Natal pela televisão. Inteira, como mandava o catecismo:“ouvir missa inteira e abster-se a trabalhos servis aos Domingos e Festas de Guarda”. E ouvi-a pavorosamente desperto (“vigiai, pois nunca sabeis o dia nem a hora”), pela primeira vez em quarenta anos. Já tinha feito outras tentativas antes, sempre à procura daquela magia do Latim que ninguém alcançava, nem mesmo o próprio padre que, na minha terra, era um corpulentíssimo bonacheirão, beberricador a tempo inteiro, e totalmente afastado das espiritualidades, às quais, na minha concepção de adolescente confuso, pertencia, certamente, a língua do Lácio, essa estranha e mortíssima linguagem que era, para mim, o mais atractivo fausto evangélico daqueles encontros dominicais com o Salvador.
Foi, pois, derretido pelas saudades do “sursum corda”(?) e do “agnus dei, qui tolis pecata mundi, miserere nobis”(???) que demandei várias vezes a capela aqui da aldeia ou mesmo a transmissão da TVI, mas sempre sem nenhum sucesso. Fosse porque às dez da madrugada de um domingo friorento não se tem muitas opções além de dormir, ou porque a música do rádio era uma escolha infinitamente mais aliciante, nunca tinha prestado grande atenção ao conteúdo da palavra de Deus.
Mas desta vez foi de vez. Assisti pacientemente a tudo. E não foram totalmente goradas as minhas expectativas de voltar a sentir o sortilégio daquele ritual impenetrável da missa da minha infância.
Ouvi “hosana nas alturas” e “que é Deus com o pai na unidade do Espírito Santo”. Ecce! Impenetrável como o latim de antanho! Tão confuso e insondável como no meu tempo.
Valeu. Recuperei aquela sensação de incomensurável ignorância que me fazia tão bem…
2 comentários:
Não é que isso me preocupe, porque nem sequer sou uma fervorosa católica nem pouco mais ou menos, mas gostava de perceber o tom deste post. É um texto anárquico. Não dá para saber se há ironia, ou se se trata de um verdadeiro regresso a Cristo. Importa-se de me esclarecer?
Sónia Santos
Sónia,
Muito obrigado por ter comentado.
Deve ser anárquico, sim. Reli-o agora para tentar esclarecê-la, e fiquei com a mesma dúvida, apesar de ter a certeza de que fui eu quem o escreveu. :)
Grande abraço.
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