A razão pela qual os portugueses (e os europeus) ainda não fizeram a revolução socialista é que não sabem exactamente em que gaveta está o livro de instruções. Marx tinha um, Bakunine também. A minha mulher-a-dias é quem melhor sabe o que deve ser feito para inverter o percurso negativo da balança de pagamentos. Qual definição shakespeariana de “génio”, ela tem em si todas as regras para a construção de um mundo melhor, sem ter necessidade de ir beber a fontes menos recomendáveis. O meu cão todos os dias me dá lições sobre com quantas patas se constrói a verdadeira felicidade e o próprio primeiro ministro de Portugal também tem um manual de fazer revoluções, embora não saiba como lhe chamar, já que é velho (o livro, claro, e não o ministro) e perdeu a capa. Proponho, para substituir a capa extraviada e, portanto, como nome da revolução de Passos, “revolução neoliberalenguista” ou “a revolução neossocioesclavagista lusitana”.
No entanto, e na impossibilidade de alguém ainda se lembrar, de facto, como se faz uma revolução, acredito que a revolução de que a Europa precisa é uma revolução lexicológica. que é, simultaneamente, uma revolução bakuninista, na medida em que sugere a transformação social a partir de um conjunto de conceitos abstractos e não de um grupo de proletários subalimentados e malcheirosos. Trata-se, portanto, de uma revolução limpa, asséptica, apenas substituindo um império de palavras por um império de outras palavras, e não a esquálida e suarenta revolução marxista, que mais não terá trazido à humanidade que um aumento exponencial na produção de deo colognes.
As revoluções lexicais são eficazes e praticamente gratuitas. Os seus resultados medem-se por descritores e parâmetros que vão do muito bom ao excessivamente excelente, protegendo simultaneamente a alegria no trabalho e a felicidade conjugal. A revolução lexicológica não é mais que uma estratégia de substituição. É só destronar umas palavras e eleger outras em seu lugar. Em vez de dívida externa, elejamos dádiva interna; em vez de coelhos, elejamos beija-flores, em vez de tróica, truca-truca. Substituamos trabalho por tremoços e cansaço por cerveja. Em vez de caderno de encargos, elejamos cabrito com espargos e em vez de fome, escrevamos sempre força. Para austeridade prefiramos mariscadas.
Toparam o sumo da revolução lexicológica? Aposto que amanhã tudo será mais azul (com bolinhas da mesma cor).
Post 820 (Imagem daqui)