Já aqui demonstrei por diversas vezes que os amigos não servem para nada. Gostaria que não pressupusessem de imediato que me sinto desiludido ou decepcionado com as suas supostamente perversas atitudes para comigo. Nada disso. Se pensasse assim, cairia pela base esta minha teoria, uma vez que, nessas circunstâncias, nunca poderia afirmar que eles não servem para nada. Ao invés, teria que concluir que eles servem, pelo menos, para nos aporrinhar a vida. Mas não. Os amigos não servem mesmo para nada. Simplesmente isso. Sem conotações nem antífrases.
Alguns de nós coleccionamos amigos como quem colecciona caixas de fósforos ou cromos de caderneta. Fazemo-lo porque achamos conveniente fazê-lo, já que criamos sobre eles expectativas improváveis que têm a ver com a sua possível utilidade em situações futuras. Lamentável equívoco.
A minha casa está cheia de quinquilharias imprestáveis, do pavimento ao tecto, esparramando-se abusivas por todas as gavetas, armários, prateleiras e baús, usurpando o meu próprio espaço, impedindo-me de caminhar, de respirar, de mudar de vida, de me reconfigurar. Adquiri essas quinquilharias (ou simplesmente as recolhi, condoído), na esperança de que elas um dia me pudessem preencher algum tipo de tédio, de vazio, me restituíssem alguma felicidade perdida, me poupassem algum dinheiro.
Sei, no entanto, que tenho algures, por certo em alguma prateleira inusitada, exactamente aquele terminal de mangueira que tive que comprar hoje para regar o jardim. Assim como sei que, há quarenta e cinco anos, fiz um amigo rico que me poderia ser útil hoje, subtraindo-me a este meu desconfortável aperto financeiro.
Mas onde diabo está esse amigo? Onde diabo está o terminal da mangueira?
1 comentário:
Superaste-te de novo. É um dos melhores que já li neste blog. A comparação entre os amigos e as quinquilharias está demais...
Abraço amigo.
SA.
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