Detesto estragar festas, mormente quando essas festas decorrem de um qualquer encantatório momento de esperança fugidia e arrimosa. E eu reconheço que, para os franceses (e mesmo para nós), aquela guinada à “esquerda” poderia perfeitamente representar o alvorecer de um novo dia para a Europa, para os trabalhadores e as suas carteiras desclassificadas. Mas não. Nada mudará, a menos que ainda haja hipótese de piorar. É ainda mais difícil que algo melhore do que eu acreditar que isso possa acontecer. Fiquemos, pois, pela incredulidade e pelo status quo da miséria permanente.
Querem saber o que me leva a este niilismo, o que me reverbera a prostração, o que me atiça o desalento? O déjà-vu. O maldito déjà-vu, o sempre-foi-assim, o antes-de-ser-já-o-era, o particípio passado da imobilidade, o supino do cinzento-pardo.
Da novidade festiva que ontem aconteceu em França já cá tivemos demais, assim como ainda temos demais do outro que ontem, em França, se foi embora. E, amanhã, continuaremos a ter demais do mesmo que temos hoje e que tivemos ontem. A prova mais comprovada deste facto é que os que temos cá hoje e a senhora que hoje ainda temos lá, já hoje vieram a público berrar o quanto estão de acordo com este novo presidente que ontem se levantou em França, muito mais de acordo do que estavam de acordo com o presidente francês que anteontem, em França, caiu. Hoje mesmo, todos, desde os nossos até à alemã, vieram considerar que, hoje sim, com o presidente que aí vem, a Europa vai reconsiderar, rejuvenescer e brilhar ao sol, tal como todos eles consideravam que ela reconsideraria, rejuvenesceria e brilharia ao sol anteontem, no tempo do presidente que se foi.
Tipos como eu, que têm o desplante e a sem-vergonhice de escrever três parágrafos (três!!!) como os que aí ficam, que se remetem a um intransponível negativismo, que se embrulham nos mais tacanhos farrapos miserabilistas, não deviam poder estragar as festas dos inocentes. Tipos como eu não deviam ter direito sequer às suas opiniões de água fria. A blogosfera devia-lhes estar vedada e deviam ser obrigados a colocar nos seus lamacentos blogues uma chancela indelével: “Cuidado, pessimista à solta! Retirem-se, cuspam e façam o sinal da cruz!
Post 834 (Imagem domínio público)
2 comentários:
Pessimista?! Eu diria realista! Os governos mudam de cor, mas a política mantém-se . Tão cedo o sol não brilhará na Europa enquanto os políticos não vestirem a pele de verdadeiros governantes em prol dos interesses do seu país /povo. Marla
Gostei do cultismo/conceptismo do terceiro parágrafo. Não partilho tanta frustração. Sou muito mais jovem... :)
josé alencar 2
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