3 de novembro de 2011

Da genialidade da invenção

diederik_stapel

…Nem eles, nem os meus alunos, nem os mestrandos, doutorandos, psicólogos, economistas, políticos, sociólogos, antropólogos e toda a casta ornitológica e restante passaredo que por aí se espenuja...

Diderik Stapel, um psicólogo holandês extremamente conceituado, tem vindo a publicar estudos vários no âmbito da psicologia relacional, como, por exemplo, um estudo sobre o efeito do poder na hipocrisia, outro sobre os estereótipos raciais ou o estudo sobre como a publicidade afecta a forma como cada um se vê a si próprio. Segundo a Visão, estes estudos são falsos, visto que o autor inventou os resultados.

A comunidade científica entrou em alvoroço, a comunicação social retirou-se envergonhada por ter um dia feito divulgação encómica e acetinada ao grande perscrutador da actividade psíquica humana.

Nada que eu não esteja farto de ver nos trabalhos dos meus alunos. Ok, ok, também em trabalhos de estágio de professores. Ok, ok, eu cedo, também em trabalhos de mestrado (e por favor, não me voltem a dizer “mèstrado” e “vàcina” e “Càrina”que se me funde o resto dos neurónios). O quê? Também de doutoramento?! Essa já é demais… Enfim, nos tempos que correm tudo é possível. Pois, eu sei. Quando fazemos um inquérito de opinião a um universo que ostente faixa etária ampla, dos 8 aos 80

anos, por exemplo, gostamos de afirmar na ficha técnica que auscultámos duas ou três mil pessoas espalhadas de norte a sul, quando, em boa verdade, auscultámos o puto lá de casa, a legítima e os pais dela que lá apanhámos num dos últimos almoços familiares. Os resultados do inquérito sempre respeitam, obviamente, a nossa hipótese. Família é família, é para estar de acordo connosco, que diabo. E ainda que essa cambada de comensais barulhentos nos refute a hipótese, que mal há em subvertê-la? Eles jamais vão ler aquilo. Nem eles, nem os meus alunos, nem os mestrandos, doutorandos, psicólogos, economistas, políticos, sociólogos, antropólogos e toda a casta ornitológica e restante passaredo que por aí se espenuja.

Mas acaso vocês pensam que inventar é mais fácil que descrever a clara certidom da verdade? Não é. Woody Allen inventou uma problemática literária baseada nas cuecas de Metterling, mas Woody Allen é um génio. Sócrates e Coelho inventaram um país e Merkl inventou um continente inteiro. O capitalismo inventou uma crise mundial para conseguir mão-de-obra a preço da chuva. Há ou não há pura genialidade nisto tudo? E eu vos garanto que tudo isto é verdade. Eu, que também sou um génio…

    Post 789       (Imagem daqui)

4 comentários:

Anónimo disse...

Bem conseguido. Ao estilo das tuas composições passadas. Em 2009 escreveste muito disto, salvo erro. Adorei este tb.
Dora Medeiros

Anónimo disse...

Genial o remate final! :) Também às vezes me questiono sobre a "verdade da mentira" e vice-versa e até que ponto as "notícias" e restante informação que nos chega via internet, radio, televisão, jornais são ou não fabricadas ou manipuladas pelos media. Outra questão pertinente abordada neste texto é o problema da fiabilidade das investigações de caráter científico. Marla

AEfetivamente disse...

Também achei genial! :) E ri-me, claro, estão de morte algumas passagens::)) Adoro este estilo nonsense, a dar cabo de tudo. Hilarious! Faty

Anónimo disse...

Obrigado a ambas por comentarem e o fazerem sempre tão simpaticamente. Gosto sempre de ler as vossas opiniões, sempre oportunas, sempre sábias. Abraços.
joao de miranda m.