17 de outubro de 2019

A vida e a Democracia

A VIDA não quer que mudemos nada, para que seja ela a mudar tudo.
A DEMOCRACIA quer que mudemos tudo, para que ela não tenha que mudar nada.

VELHO LEMBRA-SE DE CADA COISA … (22)


O MOLICEIRO DO MEU TIO

Quando eu fiz dez anos, fui passar um dia com o meu tio Lério Mesquita no seu moliceiro. Levámos batatas, tomates, pimentos e um fio de azeite para o almoço a bordo.

Chegados lá, e depois de ter visitado a casota triangular da proa onde o meu tio tinha a sua tarimba fedorenta, saltámos para a margem com um cesto de vime e, ao calcão, pescámos umas quantas enguias bem gordas.

Hora do almoço. O meu tio amanhou o peixe com a sua navalha multiusos, encheu uma lata velha com água da ria e meteu lá dentro um punhado de sal, as enguias e as tretas da horta que tínhamos trazido.

Acendeu-se o fogareiro de petróleo, à sombra da vela.

Comemos deliciados, observando, à popa, os enormes ancinhos que se iam enchendo de um moliço fino, qual couve destinada a caldo-verde.

A história termina aqui. Se desejar ler também o parêntesis, fica ao seu critério. Declino qualquer responsabilidade.

(A minha caganeira só sobreveio no dia seguinte. Para surpresa minha, a dele nunca chegou…)

7 de maio de 2019

JÁ VÃO SENDO HORAS DE DIZER COISAS (4)


(A propósito da contestação da sociedade civil à luta dos professores)

Os professores vêm sendo objecto de contestação há já muitos anos, tendo-se agudizado a situação em virtude dos actuais regimes de gestão das escolas.
Os Conselhos Gerais actuam de modo demasiado intrusivo na vida escolar. Alguns directores com ambições politiqueiras nas comunidades em que se inserem as suas escolas, optam por criar preferencialmente os seus amigos no meio envolvente em vez de virem sistematicamente em defesa do bom nome e hombridade dos seus docentes, quando estes são miseravelmente contestados e criticados por alunos ou encarregados de educação. (Destes casos concretos não tenho informações fidedignas mas, por todo o lado, nos chegam ecos desta eventualidade)
Os professores acumularam também um sem número de erros por incompetência relacional e avaliativa. A avaliação dos alunos só muito recentemente se tornou mais justa, mais esclarecida e esclarecedora. As novíssimas correntes pedagógicas que incluem os comportamentos (componentes ditas não-cognitivas ou atitudes e valores) no todo avaliativo, bem como medições de competências feitas um pouco ao acaso nesta área, por ausência de uma objectividade certeira que as sustente, tornaram indecifrável para os pais o processo avaliativo dos alunos.
Contestados por alunos, encarregados de educação, algumas direcções e, em muitos casos, pelos seus próprios pares, os professores desataram a produzir comportamentos um tanto ou quanto primários e imaturos.
O governo de Maria de Lurdes Rodrigues terá sido a pedra de toque nesta escalada de ódio mais ou menos subliminar contra os docentes, sobretudo os do ensino médio.
Alguns dos actuais encarregados de educação já contestaram e odiaram os professores, no tempo em que foram alunos, e essa antipatia transferiu-se aos rebentos, junto com o adn.
Uma permanente aversão às coisas da cultura exponenciou também esse desprezo atávico pela classe docente, de um modo particularmente opressivo.
A imagem (embora errónea, a meu ver) de um docente meio incompetente, laxista e preguiçoso, e que parece estar sempre mais interessado no salário do que na boa formação dos alunos, acicatou invejas, desdéns e antipatias de toda a ordem. (As imagens, sejam elas produzidas pelos próprios ou criadas por alheios, serão certamente representações virtuais, sem quaisquer ligações ao real.)
Enfim, imensas causas concorreram para este lamentável efeito.