(Retirado do site da APEDE)
ACÇÕES DE FORMAÇÃO SOBRE A AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES: RECRUTAMENTO IDEOLÓGICO
Por estes dias, as escolas andam a receber "propostas", mais ou menos compulsivas, de acções de formação sobre avaliação. São acções destinadas aos "avaliadores" (membros de conselhos executivos e das comissões de avaliação e coordenadores de departamento) e a alguns (poucos) "avaliados", estes últimos talvez destinados à triste função de cobaias - por antecipação, pois todos nós iremos ser ser "testados" neste sistema.
Não é difícil antever o que estas acções significam: um imenso trabalho de doutrinação - ou de lavagem do cérebro - que visa "evangelizar" o modelo de avaliação do desempenho que o Ministério pretende impor, convertendo-o numa "boa nova" que os professores deverão, depois, aplicar acriticamente. É mais um passo no esforço de arrebanhamento com que a equipa ministerial procura "pacificar" o próximo ano lectivo. Perante este quadro, a APEDE vem apelar a todos os professores, e em particular aos que irão participar (à força) nas referidas acções de formação, para que não descurem a atitude vigilante e para que mantenham o olhar crítico face a esta nova onda de propaganda. Contra a retórica com que os professores irão, certamente, ser inundados, convém recordar alguns dados elementares:
1 - A avaliação do desempenho não é, nem nunca será, uma ciência exacta (aliás, não é sequer uma ciência).
2 - A avaliação do desempenho, tal como aparece plasmada no Decreto Regulamentar 2/2008 e nas famigeradas grelhas que o concretizam, está fortemente investida, de alto a baixo, por opções ideológicas e políticas que importa saber desmontar.
3 - A suposta "objectivação" do desempenho dos professores, através de uma miríade absurda de micro-parâmetros "quantificáveis", pretende apenas fazer-nos esquecer os factos enunciados nos dois pontos anteriores.
4 - A ideologia dominante no modelo de avaliação perpetrado pelo Ministério consiste em reduzir todas as práticas institucionais ao "paradigma" economicista da "gestão dos recursos". Não é por acaso que a "formação" no referido modelo está a ser ministrada, sobretudo, por especialistas em gestão, e não por pedagogos ou por "cientistas da educação".
5 - A ideologia acima citada julga ser possível avaliar uma prática complexa como a do ensino mediante um esquema reducionista e atomista, no qual essa prática é desdobrada em itens fragmentados, descontextualizados e isolados entre si, aos quais se atribui depois um valor numérico arbitrariamente definido.
6 - A ideologia "gestionária", importada de um universo empresarial tendencialmente opressivo e totalitário, faz da compulsão a hierarquizar os "recursos humanos" uma "necessidade" que se pretende inquestionável.
7 - O modelo ministerial da avaliação dos professores adopta essa compulsão, reforçando-lhe os mecanismos punitivos e disciplinares. Trata-se, precisamente, de disciplinar os docentes, de os fazer vergar perante a ameaça de diferenciações hierárquicas enquanto relações de poder.
8 - Assim como a ideologia gestionária procura manter os trabalhadores, reduzidos a "recursos" descartáveis, sob um regime de vigilância e de controlo permanente, também o modelo ministerial de avaliação do desempenho quer introduzir nas escolas um sistema de "big brother" intrusivo, convertendo os "avaliadores" em inspectores e capatazes ao serviço de um requisito de "transparência" das práticas educativas.
9 - Nessa "transparência", toda a interacção pedagógica com os alunos perde a dimensão de intimidade sem a qual dificilmente se constrói uma relação de confiança com os mesmos.
10 - Os pontos atrás referidos colidem com uma escola onde a construção e a transmissão do saber se faça de forma cooperativa e participada, oposta ao regime de competição selvagem por um bem escasso - as classificações mais elevadas -, regime típico de um mundo mercantilizado que o modelo de avaliação quer impor aos professores e às escolas.
(Imagem tirada daqui)