29 de dezembro de 2011

Obsessões do meu ipod (31)

Alguém chamou a isto “accordgasm”. E, de facto, assim parece. É um jovem ucraniano, de nome Alexander Hrustevich, que assim interpreta um trecho do Verão de Vivaldi.O tremelicado é muito mais fácil de fazer com um arco de violino do que com o pesado fole e chave de baixos de um acordeon.

      Post 808     

27 de dezembro de 2011

Preparando os cursos da primavera

SabedoriaO Tralapraki, num apelo irresistível à cultura do país (e também das pessoas que estão dentro dele), apresenta desde já o seu boletim de primavera relativo aos cursos seguintes:

FILOSOFIA I - Teologia das Conveniências

Sumário:  Uma primeira abordagem a Deus (mas de modo que Ele não se aperceba). Explicação sumária do mistério da Santíssima Trindade e do mistério das finanças públicas. Você, por acaso, sabe que diabo se passou com o dinheiro? Eu também não sei, mas o idiota que vai dar este curso deve saber. Saiba ainda por que razão não existe mérito nenhum no facto de Deus escrever direito por linhas tortas. Qualquer aluno faz o mesmo, não só em relação ao Direito, mas em relação a todas as outras disciplinas... Vocês já viram a caligrafia do Nuno?  E as Traduções do Inglês que ele faz? 

Mecânica e Electricidade II

Sumário: Você sempre quis saber a razão por que não se pode fritar um ovo numa guitarra eléctrica ou enviar uma mensagem curta (sms) com um massajador íntimo? Aliás, você nem sequer sabe o que é um massajador íntimo. Fique sabendo que não se pode enviar uma sms com um destes massajadores, pelo simples facto de que o massajador íntimo já é, em si mesmo, uma bela mensagem. Agora V/ pode aprender tudo isso e muito mais, sem sair de casa e, com um pouco de sorte, sem mesmo sair da cama.

Sexualidade III

Sumário: Procedimentos para conseguir um pénis mais apelativo e, portanto, uma conta bancária maior. Este curso ensina-lhe com quantos paus se faz uma canoa e com quantas varas se faz uma  camisa de onze varas, sem esquecer a verdadeira função do pau de virar tripas. Tudo à tripa forra.  Você tem a certeza de que sabe usar um preservativo, ou, pelo menos, de que contratou uma parceira que sabe? Modos de pescar preservativos, quando eles ficam lá dentro. Para os mais jovens, o curso apresenta uma interessante introdução ao órgão genital feminino, numa perspectiva cavaleira.

Literatura Medieval IV

Sumário: As Cantigas de Amigo e  as Queixas de Marido, de João Ruiz do Castelo do Bode. Os Alunos são encorajados a escrever e enviar uma Cantiga do Bandido  à esposa boazona do grandão que mora por cima. Todo o material do curso é gratuito, inclusive a escada de emergência, a manga de bombeiro e uma caixa de primeiros socorros.

Introdução à Biologia e Miudezas II

Sumário: Este curso ensina tudo sobre aqueles órgãos de que ninguém fala porque nunca dão chatices: glândulas vilas molenas (José Afonso em Mandarim), fígado de bacalhau, pé de atleta, mão de vaca, palma de maiorca, espírito de porco, nove e tal, calcanhar de aquiles, corações de atum, tripa forra, língua da sogra, etc. Fique a saber a razão por que temos um baço e não temos um lustroso. e que quanto mais baço é o baço, menos transparentes são as atitudes dos nossos políticos. 

Você sabia que há homens que têm umas glândulas mamárias fantásticas, mesmo ao seu lado,  e não sabem o que fazer com elas, e até conseguem adormecer? E que, pelo contrário, há outros que não têm nada que preste e que, mesmo assim, ficam em casa todas as noites, e fazem milagres??  Pense nisso e sinta a tranquilidade de saber que o mundo nunca se vai virar. Boas aulas.

    Post  807           (Imagem daqui)

26 de dezembro de 2011

O ano que aí vem

feliz_ano_novoO nosso Primeiro-ministro afirmou que 2012 é o ano de todas as reformas e que tudo ficará pior antes de melhorar. E aquilo pareceu-me um comentário de Ehrman ou um corolário de Murphy. Cá por mim, não tenho expectativas negativas sobre o próximo ano, pois considero que expectativas negativas dão resultados negativos, ao passo que as expectativas positivas também. “Tudo ficará pior antes de melhorar” é um corolário puramente mecanicista, já que não nos são fornecidas dinâmicas e momentos de mudança. Tudo bem, sabemos que há uma tendência para o dia dar em noite e o preto dar em branco (como ficou provado em Michael Jackson) e que ao pé de um alto está sempre um baixo. O problema é saber quanto precisam as coisas de piorar para depois melhorar ou, dizendo de outro modo, quanto precisaremos ainda de empobrecer neste nosso caminho para o enriquecimento. E agora tudo isto me recorda uma banda desenhada de Malpertuis, onde um homem passa dezenas de quadrinhos a descer escadas de modo compulsivo, até que, no último quadrinho, chega finalmente ao topo de uma torre, de onde avista um estonteante horizonte…

Quanto às reformas apregoadas, não poderia estar mais de acordo. É preciso mudar tudo, para que tudo fique igual. Se deixarmos as coisas como estão, elas tenderão a modificar-se sozinhas, embora não necessariamente para pior. Obviamente, há que mudar muita coisa, sobretudo o que já está suficientemente bem. Se todas as coisas que estão bem forem mudadas, não correremos o risco de que elas piorem por si mesmas, antes teremos a certeza de que fomos nós que as piorámos, o que não deixa de evidenciar um ascendente de nós sobre as coisas.

Enfim, acabei agora mesmo de ver na TV que a crise acaba, de facto, no próximo ano. Mas também é no próximo ano que acaba o mundo. Seria de espantar que a crise sobrevivesse ao fim do mundo. Prefiro que o mundo sobreviva ao fim da crise, nem que eu tenha que pagar mais uma multa por isso…

   Post 806        (Imagem daqui)

23 de dezembro de 2011

Será avaria?

Hoje, quando acordei, acendi o candeeiro da mesa de cabeceira e reparei que a luz está mais amarelada…

  Post 805 

21 de dezembro de 2011

Exame de Português para o 11º ano Profissional

gramaticaAlvo: Alunos do 11º ANO, FINALISTAS A TENDER PARA O PRE-UNIVERSITÁRIO

Nome _____________Nº____ Turma ____

Notas: 1. É provável que não reconheças a sala onde estás, pois desta vez, como podes ver, há dois gajos na secretária, em vez de um. Não fiques preocupado pelo facto de eles não estarem a fim de falar contigo, nem de te aborrecer com o trabalho de casa. Milagres acontecem.

           2. É aconselhável que estejas sentado no lugar certo e à hora certa, sem o que poderás perder definitivamente o ensejo de executar a prova e de chegares a tempo ao almoço. Repara se tens à tua direita o Francisco Pé de Vento, à esquerda o Nuno Alguidares, atrás de ti deve estar a Mónica Lupas e à tua frente a tua vizinha Sarita, aquela das mamas grandes. que uma vez te pediu para ires ao cinema com ela e tu confundiste e foste parar à Baixa da Banheira, ainda hoje não sabes bem como.

           3. Coloca em cima da mesa os teus objectos pessoais: telemóvel, skate, gameboy ou nintendo, dois ou três cds com as cascas rachadas, etc, para te sentires mais reconfortado. Se tiveres um bilhete de identidade, podes colocar também.  Não te esqueças que aqui tens mesmo que escrever com caneta ou esferográfica e não com corrector. Tenta acertar no papel de prova que está à tua frente. Boa sorte.

I. LÊ O TEXTO QUE SEGUE: (texto é esse amontoado de palavras que vem a seguir. Podes reconhecê-lo facilmente porque te dá náuseas e pode trocar-te os olhos).

TEXTO >>> Olha, Marília, as flautas dos pastores

                      Que bem que soam, como estão cadentes!

                      Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes

                      Os Zéfiros brincar por entre as flores?

(Ufa, pronto, acabou. Agora vem aí uma caixa com vocabulário, ok?)

Caixa com vocabulário:

Flautas = Instrumento parecido com um pau, que se toca soprando numa das pontas.

Pastores = Aqui, não são padres. São uma espécie de zombies que andam sozinhos pelos montes, atrás das cabras e tocando as tais flautas. Seria mais incómodo levarem o piano de cauda da tua tia Gioconda.

Cadentes = afinadas, ao compasso. (é música, portanto)

Tejo = Não, não é o teu cão, embora, por vezes, ele pareça que, de facto, sorri. O Tejo é um rio que fica lá para o sul.

Zéfiros = O teu Professor também não sabe o que são, mas não deve ser nada de macho, pelo jeito com que brincam com as flores.

I. AGORA TENTA RESPONDER A ESTAS PERGUNTAS.   BASTA ESCOLHERES  A QUE TE PARECE MELHOR, POIS O IDIOTA DO TEU PROFESSOR JÁ RESPONDEU E NEM SEQUER SE APERCEBEU DISSO:

1.1. Gostaste do texto?

      A) Gostei muito, embora não tenha compreendido tudo.

      B) Acho que sim, porque a Mónica estava contente e ela é boa nisto.

      C) Gostei mais ou menos, mas podia ter mais acção.

      D) Sim, gostaste. (No caso de optares por esta, repara que a pessoa do verbo poderá estar incorrecta)

1.2. Quem é Marília?

      A) É a minha prima de Barrô.

      B) É a prima do Camões

      C) É a prima do Bocage

      D) É uma tipa qualquer que andava por lá atrás das cabras.

1.3. Serias capaz de escrever um poema como este?

      A) Não. Nunca teria coragem para tanto.

      B) Numa boa. Eu sou muito cencíbel à poisia.

      C) Talvez.

      D) Nenhuma das anteriores, nem das seguintes, se as houvesse.

COMPOSIÇÃO  (Composição é um emaranhado de palavras, mas, desta vez, escritas por ti. Tenta colocá-las umas atrás das outras, hierarquizando o teu texto e usando, se possível, o sujeito, o predicado e os complementos directo, indirecto e circunstanciais, se os houver. No entanto, evita colares-te demasiado à fórmula que te sugiro, escrevendo, por exemplo: "O sujeito predicou um complemento directo ao complemento indirecto, lá no complemento circunstancial de lugar". Esta frase, embora correcta na sua estrutura, não apresenta muita criatividade.)

II. Agora, para terminar, (pois já estás aqui sentado há mais de uma hora e deves estar ansioso por ires relembrar como era o sol), escreve qualquer coisa para o idiota do teu professor se entreter no fim de semana. Não o massacres muito, e tenta entender a mania que o tipo tem de querer ver as palavras todas direitas. Faz-lhe a vontade, com os diabos, um dia não são dias e eu sei que tu és bondoso quando te esforças.

Se não te lembras de nada importante, telefona ao teu pai, à tua prima Marília ou ao teu tio Faustino que sabe histórias à brava. Além disso, há quanto tempo é que não ligas ao teu tio Faustino? Aproveita e pergunta-lhe se está melhor da perna que tu lhe partiste a semana passada com um toquezito sem importância. (Os mais velhos têm tendência para serem quebradiços).Tenho a certeza de que o teu tio vai ficar tão sensibilizado como tu ficaste quando lha partiste...

Lembra-te:  deves escrever, pelo menos duas linhas e não podes entregar o cd que trouxeste, em vez do papel da prova.

As provas são anónimas. Escreve o teu nome só no cabeçalho da prova, mas faz um desenho qualquer e depois diz ao teu professor o que fizeste, para que ele possa reconhecer a tua prova e dar um jeito de te passar mais facilmente ainda.

(Boa sorte e, se por acaso estiveres com a tua prima Marília, diz-lhe  que o Tomaz Dirceu Gonzaga quer fazer um poema com ela, uma noite destas…)

     Post 804     (Imagem daqui)

19 de dezembro de 2011

… que venham de novo os “paus”

pausSe por algum motivo, ou mesmo por mais do que um motivo, tivermos que abandonar o euro, isso não fará grande mossa nas nossas vidas. Todos temos melhores recordações do escudo que do euro. O euro nunca foi muito popular na minha aldeia. O que eram 100 escudos? (100$00, lembram-se?) Ora, cem escudos eram cem paus, cem marrecos, cem marreis, etc, enfim, o escudo tinha milhentos apelidos, cada um mais carinhoso que o outro. E 100€? O que são 100€? São só cem aéreos (que metade da nossa população nunca lhe soube sequer dizer o nome, e a outra metade nunca soube quanto realmente valiam).

Que venha o escudo, assim mesmo, o escudo ou o pau, enfim, o luso, o magriço, o tuga, o Zé, qualquer coisa será melhor que o euro. O euro só nos trouxe dores de cabeça. Convenceu-nos de que éramos ricos, pôs uma dúzia de ovos a valer 400 paus e a gente pagou, quando 5 paus chegaria para pagar cada ovo. Que venham, pelo menos, 150 marreis por cada aéreo e seremos felizes. Muito mais do que somos agora… Tenho dito!                                                                                                 Post 803 

18 de dezembro de 2011

Da (in)disciplina (2)

carneiro (…) E o carneiro, apesar das ameaças do Afonso, continuava a amar, ou a odiar (que também entre os carneiros o amor anda sempre próximo do ódio) aquela triste porta…

(Uma história de carneiros)

E foi então que o Dr. Teotónio falou, expondo ao foco principal da sala a sua careca luzidia. A sua voz estava fluida, melada, mas grave. Não havia um leve traço de sorriso na sua boca, não havia nela um fugidio apontamento de ironia ou de sarcasmo.

-“O pai de um amigo meu, homem calmo e pacato, lá de cima do Caramulo, conviveu durante vários anos com um carneiro marrão que lhe destroçava sistematicamente, a marradas de aríete, a porta da cozinha. Nunca o Afonso (chamemos assim ao dono do carneiro) soubera a razão da sua (do carneiro) predilecção por aquela porta. Imaginando que se tratava da cor, foi repintando a porta até esgotar todo o leque de cores da drogaria do Machado. E o carneiro, apesar das ameaças do Afonso, continuava a amar, ou a odiar (que também entre os carneiros o amor anda sempre próximo do ódio) aquela triste porta que, da sua configuração original já só possuía o Z das duas travessas e da oblíqua que as unia. As tábuas foram sendo substituídas e pintadas mês após mês, na sequência

 

das eternas investidas do aríete.

Vendo o triste pastor que com enganos, perdão, vendo o triste pastor que não ganhava para portas, resolveu pendurar naquela um pequeno conjunto de avisos, escritos sobre papel almaço, com carvão do borralho, na mais fina caligrafia escolar, numa linguagem doce e envolvente:  ‘Senhor Carneiro, por favor, tente evitar marrar na porta’, ‘Senhor Carneiro, por caridade, abstenha-se de me partir a porta’ e mais dois ou três do mesmo teor… Como reforço positivo, o Afonso pregou, de dentro para fora, cinco ou seis dezenas de pregos, por forma a que os seus bicos ficassem ligeiramente proeminentes do lado exterior, mais ou menos isto (aqui o Dr Teotónio apontou com a unha do seu indicador uma curta porção do seu polegar).

Para abreviar, o certo é que o marrão foi espaçando as suas marradas e, em menos de uma semana, perdeu totalmente o hábito. É por isso que eu continuo convencido de que a disciplina se constrói com alguns cartazes carinhosos e delicados, espalhados com amor por toda a escola.”                                            

    Post 802       (Imagem daqui)

(Contado por Eleutério Santos)

16 de dezembro de 2011

Da (in)disciplina (1)

indisciplina(Um texto com muita cagança)

As escolas têm vindo a produzir documentos, mais ou menos estóicos, para tentar acabar com a indisciplina no sistema. Chegou ao meu Grupo um desses documentos. Foi analisado, dissecado, verberado, aplaudido, vilipendiado, exaltado. Ninguém se entende lá muito bem neste campo lodoso.

Era todo falinhas mansas, que isto de mexer na espúria requer tacto. E tudo pela positiva, porque os pais das “criancinhas” nunca aprenderam a forma negativa dos verbos. Em vez de simplesmente “não perturbar o andamento da aula”, lia-se “evitar perturbar o andamento da aula”. E assim por diante…

Não pensem que não aplaudi o documento. Ah, como aplaudi! Reconheci nele um texto medricas, nada impositivo, como a pedir perdão por simplesmente existir. Mas era a primeira vez que um normativo mais ou menos sério era produzido. Era o primeiro reconhecimento de que há indisciplina e de que esta é incompatível com qualquer aprendizagem robusta. Saudei o texto porque aconteceu e se mostrou a todos. Desprezei-o, no entanto, por se acanhar e humilhar na forma de dar ordens, como se “cumprir” continuasse a ser apenas uma conveniência e jamais uma obrigatoriedade. Mais uma vez se deixava ao critério dos professores a responsabilidade de agir em conformidade, sendo que “agir em conformidade” significa, ainda e sempre, tratar cordialmente potenciais malfeitores, como se de criancinhas inocentes, indefesas e desorientadas se tratasse.

O texto, embora finalmente coeso e atlético à defesa, continuava a tropeçar nas pedagogices e a borrar-se todo no ataque. E quando um texto baixinho se borra, inevitavelmente nos caga os calcanhares…   (continua)

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8 de dezembro de 2011

repescando tralices

burroO Burro de Orwell

Continuo a defender a escola pública una e vertical, avessa a fragmentarismos e competições bestas. O momento é, de novo, propício para relembrar isto, já que as escolas, feitas pequenas e médias empresas, refregam por melhores rankings, melhor nome na praça e melhores mercados. O mercantilismo na escola estatal alcança hoje uma taxa de defensores deveras preocupante…

(Imagem daqui)        Post 800    

5 de dezembro de 2011

Correcção ao post anterior

alegriaAfinal, foram apresentadas as gradações. Os cortes nos subsídios vão ser gradativos a partir dos seiscentos euros. O governo reconhece que seiscentos euros já é um bom salário (afinal são cento e vinte contos, que não é para qualquer um) e já vai prescrevendo um corte, ainda que ligeiro, aos intrigantes e obsoletos subsídios.

A partir de mil e cem, ninguém vê o padeiro. Isto alegra-me sobremaneira, visto que o pão engorda e, finalmente, sei, de um saber beatífico e comiserativo, que pertenço ao clube dos ricos e que poderei contribuir para derrotar a crise. E derrotar é sempre bom, nem que seja ao garujo*. Como ganho acima desse salário (e não admito que me venham, com risinhos abéculas, dizer que só ganho mais cinquenta ou cem acima disso, isso não importa, o que importa é que sou, definitivamente, rico) estou eterna e irretornavelmente colocado no clube dos heróis que, com a dádiva de dois subsídios anuais, farão um novo vinte e cinco de abril, cinco de outubro, vinte e cinco de novembro, primeiro de dezembro ou vinte e cinco de dezembro, que é quando um homem quiser…

Não só enaltecerei o egoooooooo, como salvarei o país, com tudo o que tem dentro dele, barcos e charéu e castanhas e azeite e lulas e potas e vinho verde e mafias e digeis** e portagens e ainda criarei um montão de feriados para ir passear aos domingos no supermercado***. A vida é bela e deus sabe o que faz.

*jogo de cartas ao garoto.

**tipos que põem discos nas boîtes.

***às vezes empolgo-me um bocado com a escrita…

    Post 799        (Imagem daqui)

2 de dezembro de 2011

A grande clivagem

rico_e_pobreA sociedade não está dicotomicamente dividida entre ricos e pobres. Nem entre feios e bonitos, nem entre inteligentes e estúpidos, nem mesmo entre sexualmente bem e mal dotados, embora esta última clivagem seja, entre todas, de longe a mais constrangedora. Não há mais maniqueísmo em nenhum destes tópicos. Todos somos diferentes na igualdade e semelhantes na diferença. Todos nos deixamos penetrar (em todos os sentidos, excluindo o sexual, por enquanto) por amplas gradações dos mesmos descritores sociais, todos partilhamos todos os parâmetros, todos comungamos do mel e do fel pessoal e social e não parece haver mais purezas absolutas, identidades perenes, individualidades monolíticas. Somos uma contaminação colectiva, embora não necessariamente recíproca.

Mas há uma dicotomia que prevalece. Só uma. A que separa os cidadãos que vão receber décimo terceiro e décimo quarto meses dos que nem a cor lhes verão. Ou, por outras palavras, há a fronteira inexpugnável entre as pessoas que recebem 1099 euros e as que recebem 1100. Os primeiros receberão por ano mais dois salários de 1099 euros (um total de 2198 euros) o que perfará 15 386 euros anuais. Os segundos terão auferido, no final do ano, apenas 13 200 euros, apesar de pertencerem ao grupo dos mais favorecidos, ou seja, os que ganham uns fabulosos 1100 euros. Ficou complicado? Maniqueísmo é complicado, senhores…

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28 de novembro de 2011

Um Feliz Meio Natal

sino_garrafa_pet[1]O tralapraki deseja a todos os seus leitores, e a todos aqueles a quem o seu atrapalhado autor deve lealdade, reconhecimento, amizade e dinheiro, um feliz Meio Natal, meio cheio de felicidade, alegria e subsídio…

 

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21 de novembro de 2011

Em verdade vos digo…

escano
(Escano)

Um prato de sabedoria

Fui com ele, um pouco a medo, porque nessa altura ainda não tinha consolidado o meu conhecimento sobre esta teoria

Se te convidarem para almoçar, coisa que pode ser mais provável do que imaginas, visto que tempos de crise são propícios a milagres, procura indagar primeiro se o teu providencial host é pobre ou rico. Se for rico, declina o convite. Só se come bem em casa de pobre. Pobre nunca tem nada pronto, mas “arranja-se sempre qualquer coisa”. Acreditem no que digo, que esta sabedoria de sessenta anos foi adquirida ao longo de trinta e cinco, nas mais remotas paragens onde, em troca dos mais inesperados cardápios, fui debitando toda a minha cultura anglo-saxónica.

Estava completamente settled que todo o grupo de Inglês iria, naquela tarde, gastar os últimos tostões do mês num restaurante chique, digo, fashion, que abrira portas recentemente lá na cidade de Bragança. Quis o destino que o pai de um aluno meu me raptasse para sua casa, às últimas badaladas do meio-dia. Como sempre, “não havia nada pronto, a casa era pobre, mas sempre se arranjava alguma coisa”. Fui com ele, um pouco a medo, porque nessa altura ainda não tinha consolidado o meu conhecimento sobre esta teoria, aliás, posteriormente comprovada “à saciedade” (também no sentido culinário, é claro) por outros docentes tão esfomeados quanto eu e, como eu, tão desejosos de aprender. É esta teoria simples que agora aqui vos deixo,

suculenta e graciosamente.

De facto não havia nada que se comesse, nem onde sentar sequer… Mas uma valente panela de ferro, hanging from a wire, já rescendia a sopa de feijão seco, vapor e lembranças de antanho explodindo pelas bordas do pesadíssimo testo. E claro, vem-nos Eça, o danado de fino, à cabeça. Também ele sabia muito bem que só se come bem em casa de pobre, ele que andou pelas estranjas, sempre a tentar achar iguaria melhor do que aquela que devorou, com Jacinto, em Tormes, chegando á conclusão, no fim da vida e do capítulo, que foi gorada a sua busca.

Não havia nada, era casa de pobre. Mas logo caiu, como por enquanto, um casalinho de chouriços sobre o brasido, logo se abriu o escano de pinho e uma toalha limpa, cheirosa de sabão, esvoaçou e se aquietou sobre a mesa. – “A sopa é feita com água da mina, não tenha receio”. (Pobre sempre tem uma mina algures e sempre receia a água da torneira). Vindo não sei de onde, logo estrepitou sobre a mesa uma boa canada de carrascão, daquele que vem às postas para o copo. Vinha acompanhada de um casqueiro fresco, oloroso. Pobre nunca tem nada, mas sempre se arranja alguma coisa…

Os outros não sei o que almoçaram. Nem eles, segundo vim depois a saber.

Comeram em casa de rico… Querem o quê?

Post 796 (Imagem daqui)

20 de novembro de 2011

A única filosofia…

morte-bolinhaNão, a única filosofia não é morrer e estar morto. A única filosofia é viver e nem sequer saber que existe morte. Se algum de nós sabe que a morte espreita lá no fim do túnel de cada um, já morreu, eu lhes garanto. Não há vida que resista à abominável perturbação de se desconfiar de que a morte é uma tipa intransigente. Já bem nos basta a mulher que temos lá em casa. Nem que chovam pedras de moinho (sem buraco), quando a vossa cândida esposa vos manda sair à procura de natas, de abóbora, de coca-cola ou de feijão-verde, é o mesmo que dizer que, em alguns minutos, a dispensa estará de novo fornecida. Não vale a pena explicar tudo com muitos dedos, que está a chover a cântaros (sem boca) gatos e cães (enraivecidos), picaretas sem cabo, que agora estamos finalmente de bem com a vida e até resolvemos jogar na bolsa ou fundir a nossa empresa com aquela multinacional de sucesso. Ambas (a vossa esposa e a morte) vos prescrevem, de dedo no nariz – é agora!, e pronto, nada a fazer, lá vamos nós buscar a mercadoria, por entre as picaretas, lá vamos nós pendurar as chancas, para nunca mais chutar lata. Não existe vida que resista a tal conjectura.

Não, a única filosofia é afastar-se definitivamente da morte e das mulheres que adoram cozinhar. É partir do saudável pressuposto que nenhuma delas realmente existe, mesmo que a nossa seja tão indicativa e presente como um qualquer tempo verbal.

Que falta faz à vida a coca-cola, a abóbora, a morte, o feijão-verde, o pacote de natas? Nem que sejam natas do céu, porra!...

   Post 795    (Imagem daqui)

19 de novembro de 2011

coisas giras por email

clip_image001Chegam-me frequentemente às mãos alguns pedaços de prosa que, em determinadas circunstâncias e sob determinada luz, me apetece ajudar a difundir. É o caso do que se segue.

Tal como refere o leitor que mo enviou, o texto, barrento, acutilante, demolidor, não é um primor de arte literária. É, antes, uma denúncia de que me faço eco, visto que, por vezes, sinto necessidade de ver estalarem todos os vernizes. Repito: não lhe subscrevo a forma, não lhe garanto o conteúdo, não o teria jamais escrito desse modo, não o reconheço como vindo de mim. (E não veio, de facto). Mas, solícito, deixo-o entrar em minha casa, beber da minha admiração, e apresento-o aos meus amigos, desejando que o ouçam com a atenção que merece. (A imagem que publico acompanhava o texto original no Jornal de Barcelos).

“O dia deu em chuvoso”, escreveu Álvaro de Campos. Num tempo soturno, melancólico, deprimente. “Tempo de solidão e de incerteza / Tempo de medo e tempo de traição / Tempo de injustiça e de vileza / Tempo de negação”, diria Sophia de Mello Breyner. Tempo de minhocas e de filhos da puta, digo eu. Entendendo-se a expressão como uma metáfora grosseira utilizada no sentido de maldizer alguém ou alguma coisa, acepção veiculada pelo Dicionário da Academia e assente na jurisprudência emanada dos meritíssimos juízes desembargadores do Supremo Tribunal da Justiça. Um reino de filhos da puta é assim uma excelente metáfora de um país chamado Portugal. Que remunera vitaliciamente uma “sinistra matilha” de ex-políticos, quando tudo ou quase tudo à nossa volta se desagrega a caminho de uma miséria colectiva irreversível.

Carlos Melancia, ex-governador de Macau, empresário da indústria hoteleira, personificou o primeiro julgamento por corrupção no pós 25 de Abril. Recebe, actualmente, 9500€ mensais; Dias Loureiro, um “quadrilheiro” do círculo político de Cavaco, ex-gestor da SLN, detentora do BPN, embolsa vitaliciamente 1700€ cada mês; Joaquim Ferreira do Amaral, membro actual da administração da Lusoponte com a qual negociou em nome do governo de Cavaco Silva, abicha 3000 €; Armando Vara, o amigo do sucateiro Godinho que lhe oferecia caixas de robalos e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos, enfarda nada mais nada menos que 2000€; Duarte Lima, outro dos “quadrilheiros” do círculo político cavaquista, acusado pela justiça brasileira do assassinato de uma senhora para lhe sacar uns milhões de euros, advogado na área de gestão de fortunas, alambaza-se mensalmente com 2200€; Zita Seabra, que transitou do PCP para o PSD com a desfaçatez oportunista dos vira-casacas, actual presidente da Administração da Alêtheia Editores, açambarca 3000€… E muitos, muitos outros, que os caracteres a que este espaço me obriga, me forçam a deixar de referir.

Quero, no entanto, relevar um deles – Ângelo Correia, o famoso ministro do tempo da chamada “insurreição dos pregos”, actual gestor e criador de Passos Coelho que, nesta democracia de merda, chegou a primeiro-ministro “sem saber ler nem escrever”! Pois Ângelo Correia recebe 2200€ mensais de subvenção vitalícia! E valerá a pena recuperar o que disse este homem ao Correio da Manhã em 14 de Junho de 2010: “A terminologia político-sindical proclama a existência de ‘direitos adquiridos’ (…) Ora, numa democracia, ‘adquiridos’ são os direitos à vida, à liberdade de pensamento, acção, deslocação, escolha de profissão, organização política (…) Continuarmos a insistir em direitos adquiridos intocáveis é condenar muitos de nós a não os termos no futuro.” Ora, perante a eventual supressão da acumulação da referida subvenção vitalícia com vencimentos privados, o mesmo Ângelo Correia disse à RTP em 24 de Outubro de 2011: “Os direitos que nós temos (os políticos subvencionados) são direitos adquiridos”! Querem melhor? Pois bem. Este é o paradigma do “filho da puta” criador. Porque, depois, há o “filho da puta” criatura. Chama-se Passos Coelho. Ei-lo em todo o seu esplendor, afirmando em Julho de 2010: “Nós não olhamos para as classes médias a partir dos 1000€, dizendo: aqui estão os ricos de Portugal. Que paguem a crise”. E em Agosto de 2010: “É nossa convicção não fazer mais nenhum aumento de imposto. Nem directo nem encapotado. Do nosso lado, não contem para mais impostos”. Em Março de 2011: “Já ouvi o primeiro-ministro (José Sócrates) a querer acabar com muitas coisas e até com o 13.º mês e isso é um disparate”. Ainda em Março de 2011: “O que o país precisa para superar esta crise não é de mais austeridade”. Em Junho de 2011: “Eu não quero ser o primeiro-ministro para dar emprego ao PSD. Eu não quero ser o primeiro-ministro para proteger os ricos em Portugal”. Perante isto, há que dizer que pior que um “filho da puta”, só um “filho da puta” aldrabão. Ora, José Sócrates era um mentiroso compulsivo. Disse-o aqui vezes sem conta. Mas fazia-o com convicção e até, reconheço, com alguma coragem. Este sacripanta de nome Coelho, não. É manhoso, sonso, cobarde. Refira-se apenas uma citação mais, proferida pelo mesmo “láparo”, em Dezembro de 2010. Disse ele: “Nós não dizemos hoje uma coisa e amanhã outra (…) Nós precisamos de valorizar mais a palavra para que, quando é proferida, possamos acreditar nela. Querem melhor?

“O dia deu em chuvoso”, escreveu Álvaro de Campos. É o “tempo dos coniventes sem cadastro / Tempo de silêncio e de mordaça / Tempo onde o sangue não tem rasto / Tempo de ameaça”, disse Sophia. Tempo para minhocas e filhos da puta, digo eu. É o tempo do Portugal que temos.

Nota – Dada a exposição pública do jornal com esta crónica na última página, este título destina-se apenas a não ferir as sensibilidades mais puras. Ou mais pudicas.

Luís Manuel Cunha in Jornal de Barcelos de 02 de Novembro de 2011.

(Enviado por José Santos Silva)

  Post 794     

Coçando a cabeça (3)

coçando cabeçaEstou muito preocupado, João. Ontem, a minha turma do 11M portou-se bem. Não sei o que lhes aconteceu e temo que isso possa augurar alguma tragédia. Nunca tinha visto a turma quieta, calada, atenta, disciplinada, desperta e, para cúmulo desta inusitada postura, tudo isto ao mesmo tempo. Consegui dar-lhes uma aula completa, em total harmonia, cumpri o plano e ainda aceitaram, submissos, a prescrição de um pequeno trabalho de casa que, reconheço agora, foi um erro pedagógico grosseiro. Na verdade, deveria preferencialmente ter explicado que não haveria tpc, visto que o comportamento da turma tinha sido fabulosamente assertivo, merecendo prémio chorudo e não castigo abusivo, como é sempre o trabalho de casa. Obviamente, os alunos, dotados de senso de justiça maior que o meu, não tocaram no tpc nem ao de leve e eu também nem sequer toquei no assunto e dei-me por feliz por não ter ouvido deles nenhuma repreensão consequente.

Depois da aula, dirigi-me por mail ao DT, manifestando a minha preocupação por aquilo que supus ser alguma epidemia de bom comportamento que venha a pôr em causa, de modo irreversível, todo o trabalho de ajavardamento que o ensino público tem vindo a implementar junto dos jovens. Se, por uma qualquer razão imponderável, isto continuar, correremos o risco de destruir definitivamente a identidade do nosso sistema educativo.

E pronto, fiz a minha parte, cumpri o meu dever – avisei quem de direito. Mas ainda estou estupefacto, palavra de honra…

  Post 793    (Imagem daqui)

12 de novembro de 2011

Agora a sério…

capitalSe me irrita? Irrita. Com todo o respeito que me merecem os e as poetas da cibernet, quero assumir aqui que me irrita a poesia barafundística, as tiradas de auto-ajuda, as citações moralistas e a cristianíssima imagística da caridade benevolente, da solidariedade decadente.

E irrita-me sobretudo tudo o que me sugere que me entregue à provação, de coração limpo e alma resignada. Irrita-me quem me promete dias melhores, quem me propõe édenes espirituais de felicidade tola, quem me aconselha contenção verbal e equilíbrio hormonal. Irrita-me quem nos sugere benévola e eterna compreensão, quem nos propõe que, quais hímenes complacentes, permaneçamos elasticamente dóceis a toda a investida sexual do insaciável monstro financeiro…  (Será que nunca vamos romper?…)

     Post 792        (Imagem daqui)

6 de novembro de 2011

O pedinte

violinoUma velha anedota do velho Reader’s Digest: Um pedinte, sentado numa esquina, com um velho violino na mão, vai chamando a atenção dos passantes. -“Meus senhores, dêem-me uma esmolinha, porque este violino é o meu único ganha-pão… e eu não o sei tocar.”

Substituamos agora o pedinte por um professor do ensino secundário, substituição essa que, aliás, não é demasiado forçada nem obriga a grande esforço de imaginação. Substituamos também o violino do pedinte pelo ganha-pão do professor, o canudo com que dantes via Braga, mas agora não vê nem o Cabedelo. Ficaremos então com um professor a pedir esmola numa esquina qualquer, estendendo a mão com que segura um esvoaçante certificado, sem saber exactamente o que fazer com ele…

Mas levemos o símile um pouco mais longe e, em lugar do canudo, coloquemos mesmo uma verdadeira competência para ensinar, uma competência para ensinar feita de conhecimento, de sabedoria, de vontade. Será que os professores ainda sabem mesmo tocar tal instrumento? Afinal, “ensinar” dedilha-se ou toca-se com arco? As nossas estratégias estão actualizadas? Estão as nossas cordas afinadas? São os nossos métodos eficazes ou não passam de aplicações pontuais de psicotrópicos ou choques eléctricos em alunos ora grosseiros ora sonolentos? É que, depois do que nos fizeram, não creio que sejamos ainda professores, mas sim uma espécie sui-generis de pedintes sem violino, cuja competência evanescente nos terá irreparavelmente abandonado. (Veremos se ainda a temos se um dia voltarmos a precisar dela).

E ainda que a nossa música continue espertíssima, os nossos saberes frescos e intactos, rijas e perenes as nossas vontades, não encontraremos ouvintes disponíveis nas nossas salas de aula (digo, nossas esquinas da vida…)

   Post 791     (Imagem daqui)

5 de novembro de 2011

obsessões do meu ipod (30)

 

joanbaez

 

 

 

 

Farewell angelina
the bells of the crown
are being stolen by bandits
i must follow the sound
the triangle tingles
and the trumpets play slow
farewell angelina
the sky is on fire
and i must go

there's no need for anger
there's no need for blame
there's nothing to prove
ev'rything's still the same
just a table standing empty
by the edge of the sea
farewell angelina
the sky is trembling
and i must leave

the jacks and the queens
have forsaked the courtyard
fifty-two gypsies
now file past the guards
in the space where the deuce
and the ace once ran wild
farewell angelina
the sky is folding
i'll see you in a whil

see the cross-eyed pirates sitting
perched in the sun
shooting tin cans
with a sawed-off shotgun
and the neighbors they clap
and they cheer with each blast
farewell angelina
the sky's changing color
and i must leave fast

king kong, little elves
on the rooftops they dance
valentino-type tangos
while the make-up man's hands
shut the eyes of the dead
not to embarrass anyone
farewell angelina
the sky is embarassed
and i must be gone

the machine guns are roaring
the puppets heave rocks
the fiends nail time bombs
to the hands of the clocks
call me any name you like
i will never deny it
farewell angelina
i must go where it's quiet

Joan Baez/Bob Dylan   1965     Farewell Angelina

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3 de novembro de 2011

Da genialidade da invenção

diederik_stapel

…Nem eles, nem os meus alunos, nem os mestrandos, doutorandos, psicólogos, economistas, políticos, sociólogos, antropólogos e toda a casta ornitológica e restante passaredo que por aí se espenuja...

Diderik Stapel, um psicólogo holandês extremamente conceituado, tem vindo a publicar estudos vários no âmbito da psicologia relacional, como, por exemplo, um estudo sobre o efeito do poder na hipocrisia, outro sobre os estereótipos raciais ou o estudo sobre como a publicidade afecta a forma como cada um se vê a si próprio. Segundo a Visão, estes estudos são falsos, visto que o autor inventou os resultados.

A comunidade científica entrou em alvoroço, a comunicação social retirou-se envergonhada por ter um dia feito divulgação encómica e acetinada ao grande perscrutador da actividade psíquica humana.

Nada que eu não esteja farto de ver nos trabalhos dos meus alunos. Ok, ok, também em trabalhos de estágio de professores. Ok, ok, eu cedo, também em trabalhos de mestrado (e por favor, não me voltem a dizer “mèstrado” e “vàcina” e “Càrina”que se me funde o resto dos neurónios). O quê? Também de doutoramento?! Essa já é demais… Enfim, nos tempos que correm tudo é possível. Pois, eu sei. Quando fazemos um inquérito de opinião a um universo que ostente faixa etária ampla, dos 8 aos 80

anos, por exemplo, gostamos de afirmar na ficha técnica que auscultámos duas ou três mil pessoas espalhadas de norte a sul, quando, em boa verdade, auscultámos o puto lá de casa, a legítima e os pais dela que lá apanhámos num dos últimos almoços familiares. Os resultados do inquérito sempre respeitam, obviamente, a nossa hipótese. Família é família, é para estar de acordo connosco, que diabo. E ainda que essa cambada de comensais barulhentos nos refute a hipótese, que mal há em subvertê-la? Eles jamais vão ler aquilo. Nem eles, nem os meus alunos, nem os mestrandos, doutorandos, psicólogos, economistas, políticos, sociólogos, antropólogos e toda a casta ornitológica e restante passaredo que por aí se espenuja.

Mas acaso vocês pensam que inventar é mais fácil que descrever a clara certidom da verdade? Não é. Woody Allen inventou uma problemática literária baseada nas cuecas de Metterling, mas Woody Allen é um génio. Sócrates e Coelho inventaram um país e Merkl inventou um continente inteiro. O capitalismo inventou uma crise mundial para conseguir mão-de-obra a preço da chuva. Há ou não há pura genialidade nisto tudo? E eu vos garanto que tudo isto é verdade. Eu, que também sou um génio…

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1 de novembro de 2011

obsessões do meu ipod (29)

serratNão, não é falta de imaginação. É obsessão mesmo. Já aqui coloquei este poema de Juan Manuel Serrat, num tempo em que ele fazia menos sentido do que faz agora. Os bons poemas, servidos por composições de boa têmpera, fazem sempre jeito para nos recolocarmos na História… “Pueblo Blanco” é uma tenaz e robusta descrição de uma aldeia sem mar, onde os mortos estão em cativeiro e não os dexam sair do cemitério.

clave sol

 

 

 

Colgado de un barranco
duerme mi pueblo blanco,
bajo un cielo que a fuerza
de no ver nunca el mar,
se olvidó de llorar.

Por sus callejas de polvo y piedra
por no pasar, ni pasó la guerra,
sólo el olvido camina lento
bordeando la cañada,
donde no crece una flor
ni trashuma un pastor.

El sacristán ha visto
hacerse viejo al cura,
el cura ha visto al cabo
y el cabo al sacristán,
y mi pueblo después
vio morir a los tres,
y me pregunto: porqué nacerá gente
si nacer o morir es indiferente.

De la siega a la siembra
se vive en la taberna,
las comadres murmuran
su historia en el umbral,
de sus casas de cal.

Y las muchachas hacen bolillos
buscando, ocultas tras los visillos,
a ese hombre joven
que noche a noche forjaron en su mente,
fuerte para ser su señor
y tierno para el amor.

Ellas sueñan con él
y él con irse muy lejos,
de su pueblo y los viejos
sueñan morirse en paz,
y morir por morir
quieren morirse al sol,
la boca abierta al calor, como lagartos
medio ocultos tras un sombrero de esparto.

Escapad gente tierna
que esta tierra está enferma,
y no esperéis mañana
lo que no te dio ayer,
que no hay nada que hacer.

Toma tu mula, tu hembra y tu arreo,
sigue el camino del pueblo hebreo
y busca otra luna,
tal vez mañana sonría la fortuna
Y si te toca llorar,
es mejor frente al mar.

Si yo pudiera unirme
a un vuelo de palomas,
y atravesando lomas
dejar mi pueblo atrás,
juro por lo que fui
que me iría de aquí,
pero los muertos están en cautiverio
y no nos dejan salir del cementerio.

Serrat  Mediterráneo

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29 de outubro de 2011

A educação é uma coisa muito linda…

image

No início de uma de minhas aulas, bem cedo, pouco passando das 8,30, reparei que um dos alunos se preparava para dormir, colocando ostensivamente junto das orelhas um velho despertador de lata ferrugenta que não ficava a dever nada ao que vos apresento na imagem. Aproximei-me lentamente e falei-lhe muito de mansinho: - Se pretendes despertar ainda durante esta aula, deves regular o despertador para a hora em que desejares fazê-lo. Se, pelo contrário, pretendes continuar a dormir até o fim dela, não precisas de o utilizar, pelo que deves remetê-lo de volta à mochila. Além de tudo, como deves ter já tido disso alguma percepção, há no final da aula um abominável toque de campainha que, inevitavelmente, te arrancará ao torpor da madrugada e desta lição…  - Tem toda a razão, Senhor Doutor. O senhor é, de facto, um homem sábio. Mas acontece que eu pretendo ouvir a segunda parte da sua aula. A minha mãe pediu-me que prestasse atenção, pelo menos, a cinquenta por cento das aulas da manhã. Afirmou-me que, no seu tempo, também assim fizera e hoje está bem na vida, embora isso se tenha devido, principalmente, ao facto de ter casado com um dos actuais donos das Águas de Portugal que, por mero acaso, é também meu pai. Vou, pois, guardar o despertador tal como me sugeriu, pedindo-lhe ainda dois gratos favores: Primeiro, que mantenha um nível de voz consentâneo com o meu repouso; segundo, que me acorde daqui a 45 minutos se, porventura, eu não acordar com o barulho dos alunos que entretanto, e como de costume, acordarão também por essa hora… Muito obrigado. – De nada, ora essa!

  (Imagem daqui)     Post 787     

23 de outubro de 2011

Alguns casamentos depois…

O modesto proprietário da carpintaria Torrado & Irmão viu, pela primeira vez, e por ela se apaixonou perdidamente, Helena Freitas de Macede…

Amadeu Torrado casou hoje, na capela da sua aldeia, pela primeira vez na sua vida. O feliz enlace acontece numa data particularmente mítica da vida de Amadeu e mesmo da existência humana. Neste dia 23 de Outubro, cristalizaram--se alguns acontecimentos importantes quer para a espécie humana em geral, quer para a fabulosa espécie de Amadeu, em particular.

Devo lembrar que Amadeu não foi (não é), nem de longe, um interventor particularmente relevante no acidentado decurso da História hodierna. O seu modestíssimo contributo resumiu-se à produção artesanal de umas quantas janelas e portas de acácia para as casas dos seus vizinhos. Porém, Amadeu sempre enfeitou os acontecimentos comezinhos dos seus rudes e monótonos dias com efemérides de mais proeminente pedigree. É assim que Amadeu Torrado articula a data do seu nascimento, neste dia de hoje e no conturbado ano de 1944, com o desencadear da mais sanguinária batalha naval da Segunda Grande Guerra. É assim que Amadeu conta que Pasternack, escritor russo, foi prémio Nobel da Literatura, com “Dr Jivago” , no exacto dia e ano em que ele próprio, o modesto proprietário da carpintaria Torrado & Irmão, viu, pela primeira vez, e por ela se apaixonou perdidamente, Helena Freitas de Macede, dois anos mais nova do que ele, mas já ostentando, ao tempo, previsíveis delícias de mulher.

Aguçado o desejo por predicados femininos que haviam de ser, ficou Amadeu, até hoje, remoendo consigo a jura de a apalpar, demorada e

amadeu

sensualmente, com as suas manápulas de plaina, logo que um intervalo oportuno surgisse em algum dos ciclos matrimoniais da sua Helena.

De então até hoje, o coração de Amadeu manteve-se fiel, no pensamento e no registo civil, à adorada Helena, apesar de esta ter vindo, ao longo da sua vida, a coleccionar tantos casamentos quantas as decepções de Amadeu, que assim via prorrogar-se indefinidamente o momento em que a cingiria nos seus braços eternos.

Foi assim que Amadeu assistiu, aos vinte e cinco anos de idade, ao primeiro casamento da sua amada, no exacto dia e ano em que Nixon retira do Vietname. E, a seguir, assiste ao segundo, em 1988, quando o furacão Ruby afunda o Dona Marilyn, nas Filipinas, matando 566 pessoas. Tudo isto em 23 de Outubro, tudo isto na vigência do amor incondicional de Amadeu.

Foi hoje, pelas 11 horas da manhã, no dia de aniversário dos seus 67 anos, que Amadeu, embora mais desajeitadamente do que sonhara, amassou, com as suas mãos de serrote, o quarto vestido nupcial de Helena Freitas de Macede. O fato de Amadeu Torrado era o do Crisma…

(E, pela primeira vez na sua vida, Amadeu não conseguiu aliar a este evento nenhum outro de semelhante grandeza)

  Post 786      Imagem daqui)

22 de outubro de 2011

inspiração ao gosto clássico

Caricatura jovemPossuo um inestimável e suigeneris aluno. 11º ano profissional. Há dias, chegou-se a mim para me mostrar “a sua última criação poética”, como referiu. Comecei a ler o seu poema: “Amor é fogo que arde sem se ver / É ferida que dói e não se sente / É um contentamento descontente / É dor que desatina sem doer…”

Disse-lhe eu então: “Não percebo muito de poesia, mas parece-me muito bom. É mesmo teu?”  “Claro que é meu, professor!”. “E como é que tu consegues escrever estas coisas?!”. Resposta pronta: “Sei lá, Profesor! Ocorre-me assim, de repente. Deve ser inspiração, sei lá!…”

   Post 785     (Imagem daqui)

repescando tralices

missaEnquanto não chega material novo, entretenham-se com isto. Foi escrito há quatro anos e, ao relê-lo hoje por mero acaso, achei-o tão insipidamente inócuo como o achara então. Inócuo, obviamente, mas estranhamente perturbador… Ou não, enfim…

    Post 784       (Imagem daqui)

dicionario Contribuições para o dicionário da Língua Portuguesa (1)
Biscoito
– s.m.  Pessoa com quem se faz sexo duas vezes.

20 de outubro de 2011

Recomeço

fénixO Tralapraki reabre de vez no dia 23 de Outubro. Pensámos seriamente em abrir falência. Porém o amor a este país, a este governo e a este povo fez-nos arrepiar caminho. Afinal de contas, há os empregados, o irs, o iva 23, a necessidade de exportação, etc. Além disso, o Tralapraki é um serviço público gratuito, muito bom, embora tendencialmente pior, até ficar completamente cretino, o que poderá acontecer ainda antes da bancarrota do país. Obviamente, sendo grátis, o Trala não resolve nenhum problema de nenhuma espécie. Nisto, segue os exemplos meritórios de todas as restantes instituições, mesmo aquelas que, não sendo grátis, se mostram igualmente imprestáveis.

  Post 783      (Imagem daqui)

19 de outubro de 2011

É dia de anos…

feliz_aniversario O Tralapraki faz hoje cinco anos. Está aqui está a entrar para a escola. (E bem precisa, a ver se aprende alguma coisita…)

(Imagem daqui)

15 de outubro de 2011

Vou voltar…

Burro em coura Eu sei que tenho dois ou três amigos por aí espalhados que apreciam (ou, pelo menos, suportam) ler o Tralapraki. Fiquei meio translúcido com os últimos desenvolvimentos politico-económicos e perdi parcialmente salário e imaginação. Mas vislumbra-se para muito breve uma nova onda de factos imperdíveis que obviamente tentarei trazer praki. Voltarei, pois, brevemente, alforges recarregados de birras, bocas e berros. De amuos e farpas. Um esgar torcido e amarelado também…

Voltarei. É uma ameaça!

  Post 781     (Imagem daqui)

19 de setembro de 2011

intendenciaIntendência: foram hoje corrigidos erros e gralhas em alguns textos, entre 18 de Agosto e 18 de Setembro.

    Post 780   

18 de setembro de 2011

“…mas um velho de aspeito venerando…”

avaliaçao docenteUm amigo da minha idade, que também ainda não conseguiu fugir da escola, escrevia-me há dias mais ou menos assim: ”A minha delegada de grupo é uma jovem de pouco mais de três décadas de idade, talvez quatro, no máximo. Precisa subir apenas um ou dois escalões para chegar ao topo da carreira. Mas, segundo ela, os escalões podem esperar…

Chamou-me para a ajudar a preencher os meus descritores de avaliação, que são descritores de quem não quer mais que um BOM. Fui com ela ver a grelha, que elencava, imponente, descritores de avaliação inverosímeis. Grande parte deles não me calavam, de facto, fundo na alma. Para ser sincero, não entendi mais que um terço deles, nem quanto à exegese nem quanto às intencionalidades. Nenhum deles me fazia, portanto, grande sentido. (Na minha idade e estatuto, cada vez menos coisas fazem sentido).

Diante do meu insistente pedido de colocar NÃOs por ali abaixo, ela aquiesceu em colocar apenas alguns, de modo a não comprometer o meu Bom. Se ela acedesse ao meu pedido, nem um REGULAR eu ia tirar naquela joça toda…

Ainda bem que tenho uma Delegada de Grupo companheira, compreensiva e suficientemente gerontofílica. Nem todas são assim por esse secundário fora, eu vos garanto…”

Depois, estendeu as pernas, bebeu um trago e suspirou reconfortado… 

Post 779    Imagem daqui  

14 de setembro de 2011

Era o que eu fazia, palavra de honra…

money Com o fim de denunciar uma alegada perseguição do governo à classe média portuguesa, Nuno Pombo proclama que uma pessoa que ganha 5000 euros por mês não pode ser considerada rica. Acrescenta ele ainda que considerar rico um tipo que ganha aquele salário só pode ser uma estratégia de insuflamento do ego português por meio de um processo indutivo perverso. (Já não me lembro se as palavras são dele ou minhas, mas o conceito permanece idêntico…)

Porém, a falar verdade, nas minhas relações de amizade não há ninguém que ganhe sequer metade daquilo. E eu não vivo na Nigéria, no Botswana ou no Sudão, caramba.

A ideia que eu tenho de um bom ordenado difere certamente da de Nuno Pombo. Eu acho que sim, que 5000 euros por mês é, de facto, ordenado de quem deveria ser obrigado a fazer mais alguma coisa por este país...

Cá por mim, se tivesse um ordenado de 5000 euros por mês, até deixava de trabalhar… ;)

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8 de setembro de 2011

Eficácia eficácia, sexos à parte

SexosA filosofia educacional do professor Everett J. Wilson, director do secundário na Masters School (Estado de Nova York), promove a separação dos sexos, com vista à aprendizagem diferenciada de rapazes e raparigas. A filosofia, apesar de nos parecer retrógrada e um pouco rançosa, pode muito bem estar certa, pelo menos em parte.

No meu tempo (algures entre a Antiguidade Oriental e os Beatles), não havia turmas mistas. Todos desconfiávamos da existência de raparigas, mas nenhum de nós tinha, até então, tido a ventura de estar a menos de cinquenta metros de uma delas. A primeira vez que vi uma garota numa das minhas turmas foi nos finais da década de sessenta, eu era um morceguito de 17 anos e nunca mais dei uma para a caixa nas aulas de Latim… Ainda hoje não consigo descrever a perturbação que aquela presença feminina trouxe à minha vida académica e à organização das minhas aprendizagens. (Um pouco mais tarde descobriria que o estrago que as mulheres provocam nas nossas vidas vai, de facto, muito além da nossa carreira académica).

Por seu turno, as raparigas não são menos prejudicadas nas turmas mistas, por causa das bocas impróprias ou extemporâneas da inconsequente e boçal rapaziada. De facto, é visível que a canalha do sexo masculino se costuma armar aos cágados com as suas alarvidades e que as garotas, mais maduras, acabam por lamentar o tempo que estão ali a perder na sua companhia…

Um pouco mais a sério, quem defende a teoria da separação de género baseia-se na diferença de ritmos de aprendizagem, embora não sustente, de modo inequívoco, qual dos sexos é mais rápido e qual mais lerdo.

Com um pouco de azar, perfila-se no horizonte uma nova divisão de trabalho. Basta acrescentar à questão dos ritmos de aprendizagem alguns programas, cargas horárias e disciplinas um pouco mais consentâneas com a sensibilidade do belo sexo. Et voilà.

E é assim que, em nome da eficácia educativa, se sacrifica o festivo colorido de uma turma alegremente promíscua e atarantada. Tudo no bom sentido e a bem da nação, é claro... :)

   Post 777    (Imagem daqui)

7 de setembro de 2011

Se discordarem, já cá não está quem escreveu…

indisciplinaEm Inglaterra, os pais dos alunos são multados no caso de estes faltarem às aulas. Trata-se de um castigo há muito institucionalizado na velha Albion, com o qual não posso estar mais em desacordo. Os teóricos e gestores ingleses da Educação implementaram tal estratagema para envolver os pais na luta contra o absentismo escolar. A olho grosso, até faz algum sentido. A medida obteve, de facto, resultados aceitáveis neste campo, pois que reduziu quer o absentismo esporádico, quer o abandono escolar para níveis perfeitamente aceitáveis. Antes desta medida, que já vem da segunda fase da revolução industrial, a Inglaterra beirava um absentismo infantil e juvenil que começava a ser preocupante.

Mas dizia eu no início que estava em desacordo com esta medida e desejaria nunca a ver aplicada cá no burgo lusitano, apesar de saber que, numa primeira fase, ela poderia render aos cofres do estado uma verba nada despicienda. E discordo simplesmente porque o absentismo e o abandono escolares não são, nem de longe, os mais graves, os mais frequentes, os mais nefastos problemas da Educação no nosso país. De facto, se alguns alunos, ou vários, ou mesmo uma boa quantidade deles, sobretudo dos que não querem estudar, resolverem faltar a algumas aulas, ou mesmo muitas, ou optarem definitivamente pelo abandono, tudo resultará muito mais apetecível e proveitoso para os alunos que estiverem presentes. Se nos faltarem todos os alunos que não querem estudar, o facto melhorará substancialmente a vida dos que querem.

Se desprezarmos todas as questões laterais ao ensino (aquelas que se prendem com a imagem do país fora de portas, com as questões do emprego dos docentes, com as questões estatísticas e sociológicas), quanto menos forem os alunos maior será a eficácia do ensino e melhores os resultados das suas aprendizagens. Deixem-me ser um pouco mais duro: quem não quer nem aceita o sistema, não lhe é imprescindível (a menos que voltemos a incluir aqui as questões do desemprego docente, das estatísticas para europeu ver, da promoção de ATL’s porreirinhos, da ajuda aos pais através da recepção e manutenção dos seus rebentos por baby-sitters instruídos, dóceis e amiguinhos da pequenada, etc., etc.).

Proponho, pois, um ligeiríssimo desvio àquela norma anglo-saxónica. Em vez de multarmos os pais cujos filhos se ausentem das aulas, multemo-los antes quando os seus filhos se tornarem demasiado presentes nelas, tão presentes que perturbem irremediavelmente o desejado funcionamento dos actos de ensinar e de aprender. Se multarmos sistematicamente os pais dos alunos mal comportados, resolveremos a curto prazo alguns problemas de tesouraria e outros tantos relacionados com o burn out, stress agudo, esgotamento e exaustão dos docentes mais velhos, obrigados a permanecer no sistema até perto dos 70 anos. A longo prazo, teremos finalmente alunos mais educados, atentos, disciplinados, compreensivos, atinados e, consequentemente, mais felizes…

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3 de setembro de 2011

O Accordo Orthographyco de MMVIII

acordo-ortograficoSó agora reparei que continuo a usar a reforma ortográfica de 1911 ou, quando muito, a primeira convenção ortográfico de 1931, em vez do famigerado Acordo Ortográfico de 2008. Prevarico, pois, há dois anos. Na verdade, não consegui ainda levar a sério o acordo luso-brasileiro de 1990, nem este último de 2008.

Os restantes países de língua portuguesa (nossas ex-colónias quer de África, quer da Oceânia, ou mesmo da Ásia) sucumbiram aos tratados e/ou convenções ortográficas dispostos entre 1945 e 1998. Só o Brasil e Portugal, por uma ou outra razão, preferiram permanecer com sistemas de escrita algo dissemelhantes e isso, na verdade, raramente levantou algum problema de comunicação entre mim, que sou praticamente um português de 500, e minha mulher que é uma nipo-brasileira de Kioto, S. Paulo.

Foi por esta razão, a ausência de ruído comunicacional, que descurei sistematicamente a obediência à última convenção ortográfica, a da abolição dos cês mudos preconsonânticos, E permaneci até hoje com os meus cês e os meus pês, quer os diga quer não, como insecto, árctico, baptismo e facto (no Brasil, fáquito), tão do gosto dos etimologistas oitocentistas (e do meu).

Mas não tenho nada contra o novo registo do linguajar lusitano. Não o uso simplesmente porque nem me tinha apercebido de que já estava em vigor, com usança praticamente generalizada.

Quando apanhar a primeira multa por uso indevido e antiquado da língua de Eça, de Pessoa e de Camilo, juro emendar-me de imediato. Enquanto isso não acontecer, NÃO.

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2 de setembro de 2011

Quinta-feira?! Essa não…

regresso às aulasE pronto, ontem lá voltámos todos à escola para preencher o retorno. (Enfim, todos não, que a escola agora é só para os velhos). E verificámos que os primeiros colegas que encontrámos estavam mais parecidos com o último dia de Julho do que com o primeiro dia de Setembro. Aparentemente, nenhum raio de sol tinha iluminado aquelas tezes pálidas. É como se não tivesse havido um mês de férias de permeio. Alguns estavam vestidos do mesmo modo que os deixei em Julho, a mesma pasta de lona ruça semi-ensebada, a mesma expressão ausente, o mesmo ar cansado, a mesma curvilínea ostentação dorsal. E já se reinstalara neles o discurso pedagógico, que tão rapidamente substituíra o balnear. E tudo isto no primeiro dia de Setembro! Alguns, mais jovens do que eu, tinham pedido a reforma e referiam-se a isso com olhos luzidios, marejados, Disseram que não aguentavam mais.

E eu, que nunca percebo nada do que se passa ao meu redor, saí dali com um perturbador receio do contágio e vim continuar as férias até a próxima segunda-feira, pelo menos, que ninguém se lembra de começar seja o que for a uma quinta-feira, muito menos uma planificação, um teste diagnóstico, uma reunião de análise de resultados ou qualquer outra cretinice semelhante…

Se houve alguma dessas coisas ontem, ou mesmo hoje? Resposta: Não faço a mínima ideia, nem tenho tenções de saber… bahhhh!

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29 de agosto de 2011

A verdira (ou ficar-me pelas pedrinhas)

areia-de-praia--pedra-e-conxa-3ef2d(coisas de velhos que tiveram preguiça de ter fé…)

Ontem na praia, olhei para o mar e voltei a olhar. E não entendi.

Decididamente não entendo o mar. Nem Deus. Nem nenhuma das coisas grandes. Não entendo a Verdade.

Olho para o mar e vejo que me suplanta, me excede, me esmaga.

Mas ele atirou para os meus pés descalços uma orla de pedras miúdas, polidas, de cores fáceis, de metafísica módica. Conto-as, dedilho-as, admiro-as, amo-as, entendo-as. Do grande mar-deus-verdade nada sei. Mas sei dos pequenos seixos com que me atapetaram a orla das ondas, com que me reposicionam a aprendizagem das coisas simples. A verdade é longa demais para o meu sentido tão curto, como a mentira é curta demais para o meu desejo tão longo…

Fica-me a verdira, o meio caminho entre uma e outra. Aí, nessa orla de mornas e acessíveis aquisições gnoseológicas, poderei viver aceitavelmente esclarecido.

Ontem na praia, as pedras coloridas que o mar me deu…

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28 de agosto de 2011

não percebo, “prontos”…

dinheiro-voandoNeste momento, no mundo inteiro, somos 7 000 000 000 de humanos. Neste mesmo momento, no mundo inteiro, existe o equivalente a 350 000 000 000 000 dólars em papel-moeda. Nesta ordem de ideias, eu devia ter no banco o equivalente a 50 000 dólares. Muito bem. Então, porque é que eu tinha o saldo a descoberto ontem, quando a EDP tentou sacar da minha conta poupança, por débito directo, os 198 euros de electricidade que consumi nos últimos dois meses?!!

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25 de agosto de 2011

O sono e o Trala…

relogio4Meus amigos, as tão sonhadas, ambicionadas e idolatradas férias esvaíram-se. Mal comparando, é como se, de certa forma, a vida também se esvaecesse um pouco, empurrando-nos para esta outonal letargia psicossomática.

Acreditem se quiserem, mas não há nada que mais atente contra a saúde e a longevidade humanas do que este facto, sempre tristemente repetido, de vermos fugir o verão e a vida boa.

Alguns, mais bem aparentados com os deuses, vão atrás dele e conseguem repetir as férias em outro hemisfério, praticamente sem interregno. Esses que perseguem o sol e dominam este nosso (des)humano condicionalismo vivem muito mais tempo, simplesmente porque dormem muito menos e riem muito mais...

Com sono ou sem ele, o Tralapraki está de volta. Não faço ideia que novas motivações ele nos trará. Porém, como a fasquia das minhas expectativas em relação ao futuro está literalmente pousada no chão, o futuro e o Trala não poderão ser senão brilhantes.

(Brilhantemente deprimentes?)

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6 de agosto de 2011

Façamos aqui um curto intervalo…

sombra

…para ir molhar os calções. Voltaremos antes das vossas saudades… :)

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29 de julho de 2011

Avaliação sim, mas sem luxos, por favor!

jantar confratAfinal, quem me vai avaliar é o meu colega da escola ao lado. Só pode ser da escola ao lado, porque não há dinheiro para subsídios de transporte. E sabem quem avalia esse meu colega da escola do lado? É o meu colega da outra escola que, por sua vez, será avaliado por mim.

Este sistema, que aqui simplifiquei generosamente, pode, no entanto, complexar-se um pouco, introduzindo mais elementos de permeio, tais que A avalia B que avalia C que avalia D que avalia E que avalia A.

Quanto mais elementos entrarem neste círculo, maior terá que ser a mesa e mais caro ficará o jantar de confraternização, facto que sugere um despesismo supérfluo que, em tempo de crise, apenas beneficiará o dono do restaurante.

Muito mais em conta ficaria a avaliação se tudo se resumisse, como inteligentemente proponho, a dois elementos que se avaliassem mutuamente, cumprindo a fórmula A avalia B que avalia A. Às tantas até se conseguia fazer um belíssimo trabalho sem sequer ter que ir ao restaurante. Uma bica em copo de plástico, tirada na máquina da escola, depois da aula assistida, serviria perfeitamente. É que a vida não está para luxos. Nem a vida, nem a avaliação docente, caramba…

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Férias - primeiro dia

verao2Na verdade, quando se tem que entregar um relatório com data marcada, nem sequer se pode considerar que se está de férias. Hoje é o meu primeiro dia de “férias” mas também é a minha sétima tentativa de escrever o relatório de auto-avaliação. Sempre que me sento ao computador, a fim de preencher aqueles espaços, senta-se comigo também a alergia que desenvolvi ao referido relatório e só me dá para espirrar, tomar café, fazer downloads, subir às árvores, dar volta à chave e sair por aí…

É o que pretendo fazer agora (dar volta à chave e sair por aí), visto que, ao abrir o documento pela sétima vez (número cabalístico), me deu um formigueiro no cu que não me permite ficar aqui sentado. E, portanto, segue-se que estou de saída.

Quem sabe um dia destes sou acometido de uma tresloucada inspiração com carácter de urgência e elabore, em duas penadas, o melhor relatório de autoavaliação da temporada. Assim espero. Por agora, há que sair, também com carácter de urgência.

(Só vim aqui dizer-vos isto, na esperança de que alguém, igualmente alérgico, me receite o antídoto que lhe tenha devolvido a tranquilidade… )

Boas férias.

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20 de julho de 2011

Les uns et les autres

velho profEste ano lectivo que passou, talvez por não ter grande coisa que fazer (a matéria relativa à avaliação de professores deixou de me afectar e o trabalho lectivo não foi desesperante) entretive-me a descobrir quem seriam os professores mais populares lá da escola. Nos corredores, fui observando quem era mais cumprimentado pelos alunos e quem menos caso fazia desses cumprimentos. Analisei depois, atentamente, quem era convidado para os festins, para as patuscadas e pândegas. Bisbilhotei o facebook e tomei notas sobre as imagens de popularidade e/ou de competência que se me foram insinuando nos mais diversos areópagos escolares, académicos e autárquicos do burgo onde me enterrei vai para 30 anos.

Encontrei professores que gozavam, em certos momentos, de uma popularidade quase infinita, mas que derrapavam em outros, voltando a guindar-se mais tarde aos píncaros da reputação, para voltarem depois a cair, com algum fragor, num novo esquecimento. Eram os inconsistentes, os que velejavam ao sabor das contingências do êxito e do fracasso, sofrendo intimamente com esta perturbante flutuação.

Encontrei também um pequeno grupo de professores permanentemente em alta. Adorados pelos alunos, eram, por uma espécie de osmose, venerados pelas comissões de pais e, por conseguinte, respeitados por directores agradecidos. Estavam, obviamente, no grupo das pessoas que figadalmente abomino e nunca vislumbrei neles um rasgo de competência, sabedoria ou grandeza.

Os restantes eram gente desinteressante e amorfa. Trabalhavam para os alunos manhã, tarde e noite dentro, anónimos e obscuros, numa espécie de escravatura inalienável. Nunca faltaram a uma aula ou a um apoio, e só quando a doença lhes bateu à porta é que foram, de chapéu na mão, esmolar um atestado médico. E mal lhes arrancaram parte de uma víscera insana, voltaram à escola, amarelos da quimio, a prosseguir a sua cisma de ensinar, superando-se sempre, escondendo a dor na Literatura, na Física, no Teorema de Pitágoras. Ninguém os conhece. Os alunos não os prezam, o ministro não os distingue, o director não os louva. Dir-se-ia que só eu os vejo. (Mas não falo a ninguém da sua existência…)

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